Hermes C. Fernandes
Quem nunca foi passado para trás que atire a primeira pedra. Quem jamais se viu assinando um atestado de idiotice ao permitir que se obtivessem vantagens às suas custas? O mundo é dos espertalhões, dos que seguem à risca a cartilha da Lei Gérson, buscando levar vantagem em tudo. Mas o Reino de Deus é dos idiotas. Dos que oferecem a outra face. Dos que andam a segunda milha. Dos que sofrem o prejuízo calados. São justamente esses que Deus usa para expor os espertos ao ridículo. De repente, o que soava estupidez, demonstra ser a mais refinada sabedoria, o que parecia ingenuidade, revela-se prudência.
Há quase vinte e cinco anos tive a oportunidade de adquirir um terreno na região de Vargem Grande, Jacarepaguá, por algo em torno de 5 mil dólares (Se não me engano, à época havia paridade entre o dólar e o recém lançado real). Para adquiri-lo, teria de me desfazer do meu carro, meu velho chevette branco. Acabei desistindo. Hoje me arrependo de ter desperdiçado aquela oportunidade. Este mesmo terreno já deve valer mais de vinte vezes mais. A valorização da região começou quando a Xuxa resolveu mudar-se para lá. Depois vieram os parques aquáticos, o centro gastronômico, e finalmente, a duplicação da Estrada dos Bandeirantes. Ah se eu pudesse retornar no tempo...
Há quase vinte e cinco anos tive a oportunidade de adquirir um terreno na região de Vargem Grande, Jacarepaguá, por algo em torno de 5 mil dólares (Se não me engano, à época havia paridade entre o dólar e o recém lançado real). Para adquiri-lo, teria de me desfazer do meu carro, meu velho chevette branco. Acabei desistindo. Hoje me arrependo de ter desperdiçado aquela oportunidade. Este mesmo terreno já deve valer mais de vinte vezes mais. A valorização da região começou quando a Xuxa resolveu mudar-se para lá. Depois vieram os parques aquáticos, o centro gastronômico, e finalmente, a duplicação da Estrada dos Bandeirantes. Ah se eu pudesse retornar no tempo...
Por ocasião de minha mudança para os EUA, vendi a casa que tinha numa
vila em Jacarepaguá por um preço módico. Pouco depois, soube que bem próximo
dela passaria a Transolímpica, nova
via aberta pela prefeitura do Rio. Se houvesse esperado um pouco, poderia tê-la
vendido por três vezes o valor que consegui. Dessa feita, precipitei-me.
Quando o governo do Rio de Janeiro
estava implantando uma Unidade de Política Pacificadora na maior favela da
América Latina, a Rocinha, uma casa que antes custava
70 mil reais, passou a ser negociada por mais que o dobro deste valor. Quem
comprou um imóvel antes da chegada da UPP deve ter celebrado. Fez um ótimo
negócio. E se fosse o contrário? Quem compraria um imóvel sabendo que este se
desvalorizaria de uma hora para outra por conta de uma prometida invasão do
tráfico? Pois algo parecido ocorreu na Jerusalém dos tempos de
Jeremias, o profeta.
Por ordem de Deus, Jeremias advertira os seus moradores de
que o juízo divino era iminente. A cidade seria invadida pelo exército
babilônio, que a reduziria a escombros e levaria seus filhos cativos.
Zedequias, rei de Judá, tentou coagir o profeta a calar-se, pois suas profecias
estavam provocando muita agitação entre os habitantes de Jerusalém. Como o
profeta era incorruptível, não restou alternativa senão mantê-lo sob custódia,
evitando-se assim que o caos se instalasse.
Preso, sabendo que a cidade já estava sitiada pelo exército
de Nabucodonosor, Jeremias que recebe de Deus uma ordem inusitada: Adquirir uma
propriedade nos subúrbios de Jerusalém (Jr. 32:6-7).
Definitivamente, aquela não era uma boa hora para comprar
uma propriedade.
No outro dia, seu primo Hanameel veio visita-lo na prisão,
oferecendo-lhe sua herdade em Anatote. Se Deus não lhe houvera avisado um dia
antes, Jeremias certamente acharia que seu primo lhe queria passar pra trás.
Talvez a intenção de Hanameel até fosse esta. Para ele, não haveria melhor
momento de se livrar daquela propriedade do que naquela hora, antes que a cidade
fosse invadida e destruída.
Mesmo que as intenções de alguém sejam más, Deus pode
usá-las para benefício daqueles que n’Ele esperam. Ou não cremos que todas as
coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus?
Interessante notar que o nome “Anatote” significa “resposta
à oração”. Não sei se Jeremias já fazia planos de adquirir seu pedaço de chão.
Mas se aquilo era a resposta de suas orações, não teria chegado em momento inoportuno?
Se às vezes temos a impressão de que
Deus pareça se atrasar, outras vezes parece que Ele se adiantou.
Jeremias não era ingênuo, como talvez seu primo imaginasse.
Ele era capaz de enxergar os propósitos divinos por trás das intenções
inconfessáveis de Hanameel.
Em posse das escrituras do terreno, Jeremias estava
impossibilitado de visitá-lo. E mesmo que pudesse, de que adiantaria, se a
cidade estava prestes a ser conquistada? Para um esperto em mercado imobiliário, aquela era hora de
vender, não de comprar. Hanameel receberia um atestado de esperteza, e Jeremias
um atestado de idiotice.
Deus nos chama a tomar a contramão do mundo. Vendemos,
quando todos estão a comprar. Compramos, quando todos estão a vender. Apostamos no cavalo no qual ninguém se atreve a apostar. Andamos por fé, não por vista. Não somos
guiados pelas manchetes dos jornais. Vivemos por convicções, não por conveniências.
Que vantagem os espertalhões poderão tirar em cima
de quem persegue os propósitos divinos, em vez de viver em função de propostas indecorosas?
Imagino que ninguém tenha entendido a razão de tal
aquisição. Ele mesmo havia avisado ao povo levado cativo para a Babilônia que
lá deveria estabelecer-se, sem pressa, comprando campos, construindo casas,
casando seus filhos, e orando para que a cidade prosperasse, pois a sua própria
prosperidade adviria de seu êxito. Sua estada em Babilônia duraria o
equivalente a duas gerações (70 anos). Portanto, num futuro a curto e médio
prazo, não haveria esperança de que retornassem a Jerusalém, contrariando assim
o prognóstico de outros profetas, que no afã de agradarem a opinião pública e o
rei, afirmavam que sua passagem por Babilônia seria relâmpago (Jr.29:4-11).
Sem saber ao certo o que fazer com documentos da propriedade
que acaba de comprar, Jeremias ouve dos lábios do Senhor: “Toma
estas escrituras, este auto de compra, tanto a selada, como a aberta, e
coloca-as num vaso de barro, para que se possam conservar muitos dias. Porque
assim diz o SENHOR dos Exércitos, o Deus de Israel: Ainda se comprarão casas, e
campos, e vinhas nesta terra” (Jr. 32:14-15).
Aquela aquisição não era para ser desfrutada em seus dias,
mas no futuro, quando Jerusalém fosse novamente habitada por seu povo. Para
tanto, suas escrituras deveriam ser preservadas num recipiente que impedisse a
sua deterioração.
Estamos acostumados a pensar no futuro apenas em termos de
curto e médio prazo. Porém, Deus enxerga o futuro muito além de nosso próprio
horizonte existencial. Há coisas que fazemos hoje que repercutirão para as
gerações que vierem bem depois de nós. Por isso, não temos o direito de ser imediatistas. Mais
importante do que aquilo que desfrutamos em vida é o que deixamos como legado para
as próximas gerações.
De acordo com as instruções dadas por Deus, as escrituras
daquele campo deveriam ser guardadas em um vaso forte, que as preservasse por
muito tempo. Onde temos guardados aquilo que Deus nos tem confiado? Em quais
estruturas temos preservado tão valioso tesouro? Em que estado estarão quando
forem redescobertas no futuro? Como nossos descendentes avaliarão nosso legado?
Que repercussão terá nosso trabalho num futuro distante? Ora, se as escrituras
se perdessem, não comprovaria sua propriedade. Seus descendentes não poderiam reivindicá-la.
É lamentável perceber que a igreja hodierna demonstra
preocupar-se exclusivamente com os resultados imediatos de suas estratégias mirabolantes.
Por conta disso, sua relevância e credibilidade têm sido minadas. Guardamos
nossas “escrituras” em vasos rachados, expondo-as à constante infiltração e
deterioração.
Deus nos chama a comprar campos aparentemente sem qualquer
valor. Ele nos comissiona a atuar em áreas tidas por irrelevantes aos olhos de
muitos. Tudo indica que o mundo esteja a caminho de um trágico fim. Em vez de
nos desesperarmos, somos convocados a anunciar que há esperança. Nem tudo está
perdido. Temos as escrituras de propriedade do mundo. Abraão, do qual somos
descendentes, foi constituído por Deus como herdeiro do mundo (Rm.4:13). Cristo
recebeu as nações como herança (Sl.2). Portanto, o mundo não vai acabar, como advogam alguns, mas ser plenamente restaurado.
Adquiramos o campo da cultura, das ciências, da educação, da
política (por que não?), da tecnologia, da mídia. Invistamos no “mercado futuro”.
Mas cuidemos para que as escrituras sejam bem armazenadas, a fim de que os
valores inegociáveis do reino não sejam corrompidos.
Investir é correr riscos! E ninguém se atreveu a correr
risco maior do que Deus ao investir em vasos de barros como nós, fazendo-nos
depositários de seu maior tesouro (2 Co.4:7), os ideais do reino. Sabemos,
porém, que todo vaso tem prazo de validade curto. Ainda que nosso homem
interior se renove dia após dia, nosso homem exterior acaba por deteriorar-se
com o tempo. Por isso, urge que constituamos novos depositários de tais
riquezas. Atendamos à recomendação dada por Paulo a Timóteo, confiando o que
temos recebido a “homens fiéis, que sejam
idôneos para também ensinarem os outros” (2 Tm. 2:2). Ora, se não forem
fiéis a nós, como serão fiéis àquilo que de nós receberam? Serão daqueles em que confiarmos que as gerações futuras receberão a mensagem que hoje tanto prezamos. Portanto, que sejam fiéis! Que não traiam sua consciência! Que mantenham-se comprometidos com os valores que lhes forem legados.
Que ajamos agora, focando nos dias vindouros, a fim de que vejamos o cumprimento da promessa que diz: “E eles serão o meu povo, e eu lhes serei o seu Deus; e lhes darei um mesmo coração, e um só caminho, para que me temam todos os dias, para seu bem, e o bem de seus filhos, depois deles” (Jer.32:39)
Abaixo, uma das mais lindas canções de Chico de Buarque, cuja letra vem a calhar com o objetivo desta reflexão.
Que ajamos agora, focando nos dias vindouros, a fim de que vejamos o cumprimento da promessa que diz: “E eles serão o meu povo, e eu lhes serei o seu Deus; e lhes darei um mesmo coração, e um só caminho, para que me temam todos os dias, para seu bem, e o bem de seus filhos, depois deles” (Jer.32:39)
Abaixo, uma das mais lindas canções de Chico de Buarque, cuja letra vem a calhar com o objetivo desta reflexão.
Futuros Amantes
Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar
E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você
* Acompanhe a continuação desta reflexão nos próximos dias.
Fixando-me um pouco na parte inicial do texto, vc poderia fazer uma postagem sobre esse assunto? Tenho muitos conflitos com minha esposa por discordarmos profundamente sobre isso. Levo o prejuizo ate o limite mais tardio, enquanto ela se baseia no fato de que as viuvas gregas reclamavam em atos, paulo perguntou se não tinha alguem pra julgar entre os corintos(ou seja, alguem reclamou de algo) e por aí vai. Qual o limite?
ResponderExcluirQuando o prejuízo é pessoal, devemos nos dispor a sofrê-lo. Porém, quando a injustiça acomete a outros, devemos nos manisfestar, ainda que sejamos parte do grupo que está sendo lesado. Acho que é bem por aí...
ResponderExcluir