segunda-feira, fevereiro 29, 2016

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Lady Gaga, uma igreja gagá e o Empoderamento da Mulher



Por Hermes C. Fernandes

Na noite deste domingo, pude constatar mais uma vez a veracidade e atualidade das palavras de Jesus: “O vento sopra onde quer. Você o escuta, mas não pode dizer de onde vem nem para onde vai”[1] Vi-o soprar em nossa igreja no Engenho Novo, quando tive a grata satisfação de ouvir minha filha Revelyn que acabou de completar 21 aninhos, pregando com graça acerca de assuntos que raramente são ventilados dos púlpitos. Sob o título “O mundo está chato ou nós que perdemos a sensibilidade?”, por cerca de uma hora a jovem pregadora discorreu sobre preconceito racial, homofobia, assédio sexual e empoderamento feminino. Isso mesmo que você leu: empoderamento feminino. Muito além do meu orgulho de pai, foi gratificante perceber que minha filha representa uma nova geração de cristãos atenta às demandas sociais de nosso tempo.

Mais tarde, o mesmo vento soprou na cerimônia do Oscar em Los Angeles. Ninguém menos que Lady Gaga foi o canal usado por Deus para denunciar o abuso sofrido por milhões de mulheres ao redor do mundo. A cantora convidou várias vítimas de abuso sexual para o palco da premiação, enquanto fez uma emocionante apresentação de "Till it happens to you", música do documentário The Hunting Ground. 

 De fato, cada vez que nos calamos diante da injustiça, Deus levanta pedras que se fazem preciosas ao clamar em nosso lugar. Para cada igreja gagá, perdida no tempo e no espaço, Deus levanta uma Lady Gagá, uma Beyoncé, e tantos outros para amplificar a voz dos oprimidos. Se isso te incomoda, reclama com Deus.

Talvez alguém se pergunte: Desde quando assuntos como ‘empoderamento feminino’ e assédio sexual deveriam constar da agenda cristã? Respondo: desde sempre! A dificuldade que temos de encontrar base bíblica para tais demandas se deve ao fato de insistirmos em ler a Bíblia com as lentes bifocais do machismo e do moralismo.

Vejamos, por exemplo, o que diz Paulo em sua primeira carta aos aos cristãos da cidade de Tessalônica:
“A vontade de Deus é que vocês sejam santificados: abstenham-se da imoralidade sexual. Cada um saiba controlar o próprio corpo de maneira santa e honrosa, não com a paixão de desejo desenfreado, como os pagãos que desconhecem a Deus. Neste assunto, ninguém oprima a seu irmão nem dele se aproveite." 1 Tessalonicenses 4:3-6a  

Repare como nossa leitura é ideologicamente comprometida. Nossos olhos se voltam para a expressão “imoralidade sexual”, e logo pensamos em sexo fora do casamento, adultério ou pornografia. Mas o que Paulo está defendendo aqui nada mais é do que o empoderamento do próprio corpo. “Cada um saiba controlar o próprio corpo...” Logo, ninguém tem o controle sobre o corpo alheio. Logo em seguida, ele arremata: “Neste assunto, ninguém oprima a seu irmão nem dele se aproveite”. Bingo! O que vem a ser isso? Empoderamento! Já naquela época, abusos eram cometidos, principalmente contra a mulher, por ser considerada mais frágil. Usar o sexo para oprimir alguém nada mais é do que lançar mão da força física, ou da posição de autoridade, para exigir do outro alguma gratificação sexual. Isso sim é imoralidade sexual.

Recentemente, ouvi de uma professora de psicologia forense que boa parte das mulheres brasileiras é estuprada por seus próprios parceiros. Se a mulher diz não e o homem insiste, o ato sexual é classificado como estupro aos olhos da lei. Uma colega levantou a mão e comentou: Você está dizendo que tenho sido estuprada pelo meu marido ao longo dos anos?

Tal prática é relativamente comum no meio cristão e é defendida pelos paladinos da moral e dos bons costumes tomando por base um trecho bíblico mal compreendido. Confiramos:

“O marido deve cumprir os seus deveres conjugais para com a sua mulher, e da mesma forma a mulher para com o seu marido. A mulher não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim o marido. Da mesma forma, o marido não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim a mulher. Não se recusem um ao outro, exceto por mútuo consentimento e durante certo tempo, para se dedicarem à oração.”
1 Coríntios 7:3-4

Observe que o mandamento apostólico (que na verdade é uma concessão) começa pelo dever do homem, não da mulher. Portanto, é uma via de mão dupla. O dever conjugal começa pela marido. Ele deve ser carinhoso, atencioso, e não usar de seu poder marital para abusar física ou emocionalmente da mulher. O problema começa quando esbarramos com a seguinte fala: “A mulher não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim o marido...” Eita! Paulo soa bem machista neste ponto, né não? Mas não se precipite em sua conclusão. Deixe que ele conclua seu raciocínio. “Da mesma forma”, declara, “o marido não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim a mulher.” Já pensou que alguma mulher resolver sodomizar o marido? E aí? Ele terá que aceitar? Se ela for uma ninfomaníaca? Se quiser sexo todos os dias? Será que ele dará conta? Baseado neste texto pinçado do contexto, ele não poderá alegar estar indisposto, com dor de cabeça ou coisa parecida. Se não der no couro, estará contrariando um princípio bíblico! Bullshit! Vamos deixar de machismo e ler o restante do texto? “Não se recusem um ao outro, EXCETO POR MÚTUO CONSENTIMENTO”. Opa! Você leu isso aí? Mútuo consentimento? É isso mesmo, produção? Então, a última palavra sobre o meu corpo continua sendo minha. A decisão quanto a dar ou não continua sendo da mulher. Então, não me venha com chorumelas, seu machista!

A linha de raciocínio de Paulo é qualquer coisa, menos machista. Mas é Pedro quem chuta o pau da barraca.

“Igualmente vós, maridos, coabitai com elas com entendimento, dando honra à mulher, como vaso mais fraco; como sendo vós os seus co-herdeiros da graça da vida; para que não sejam impedidas as vossas orações.” 
1 Pedro 3:7

Mulher tem que ser honrada! Ela sempre tem a última palavra. Se ela não quiser, não insista. Respeite-a. Caso contrário, Deus se nega a ouvir suas orações. Deus não ouve oração de machistas!

Uma palavra às meninas: Se o marmanjo está forçando a barra, cai fora! Se ele ousar fazer chantagem emocional, mete um pé na bunda dele. Quem pede prova de seu amor, prova não te amar. E mais: se não te respeita durante o namoro, não te respeitará durante o matrimônio.

O corpo é seu! Não aceite que ninguém o toque sem o seu consentimento. E se o fizer, denuncie. Quem abusa tem que ser exemplarmente punido para que não continue a abusar. Tentou com você, vai tentar com outras.

Sexo é bênção! Sexo é graça! Sexo sem amor é prostituição, é coisificação do ser. Prostituição é fazer por dinheiro, ou por poder, ou meramente por prazer, o que deveria ser feito exclusivamente por amor. Não aceite menos que isso. Valorize seu corpo, pois, afinal, ele é templo do Espírito Santo.

Obrigado, Revelyn, minha filha. Tenho aprendido muito com você e com o Rhuan, seu irmão. A geração de vocês vai sacudir este mundo.





[1] João 3:8

P.S. O Oscar deste ano teve de tudo. Teve Chris Rock, apresentador da cerimônia, com suas tiradas sarcástica, abordando a questão da discriminação racial e a ausência de negros na lista dos indicados; Lady Gaga cantando em protesto rodeada de vítimas de abuso sexual, e, por fim, o discurso engajado do vencedor do prêmio de melhor ator Leonardo DiCaprio em favor do meio ambiente e das populações indígenas. Qual foi mesmo a última vez que temas como estes foram tratados em nossos púlpitos? Por que preferimos evitá-los? Por que nossa espiritualidade é tão alienada da realidade? Por que fazemos vista grossa ao sofrimento de milhões de negros, índios, mulheres, gays e de outros segmentos sociais? Talvez a igreja tenha sido muito bem representada pela participação inédita de Glória Pires como comentarista da premiação na Rede Globo. Numa de suas inserções, ela disse: "Sobre isso, não sei opinar". Ora, se não sabia, o que estava fazendo ali? Se não temos opinião a dar sobre as demandas da atualidade, o que estamos fazendo aqui?

Assista abaixo a memorável apresentação de Lady Gaga no Oscar 2016:

 

5 comentários:

  1. Interessante o seu texto. Concordo que, de fato, existem muitas demandas sociais com as quais a Igreja de Cristo deve se envolver. Contudo, acredito que isso é algo que requer um pouco mais de cuidado para que não passemos de Igreja de Cristo à organização social ou algo do gênero. Temos uma missão bem clara aqui nessa terra e, na minha limitada visão, acredito que, antes de tentar resolver problemas com os acima elencados, devemos nos concentrar nela. É obvio que uma coisa não exclui a outra. No entanto, para que não percamos o foco, acho interessante fazer essa ressalva.

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  2. Anônimo11:51 AM

    Meu caro Renato Balbino, as igrejas que mais nada é do que templos denominações já são organização mafiosa há muito tempo, acorda meu!
    Um exemplo a Igreja Batista da Lagoinha em BH MG, não é chamada mais de igreja e sim de organização.
    Os pastores dessa igreja a Babilônia igreja Batista da Lagoinha tem que ter nos seus e-mail assim: fulano de tal@lagoinha.org.br, tudo nesta igreja da Lagoinha tem que ter org.br, e esta igreja tem dono que é o pastor Márcio Valadão e família Valadão, e esta igreja há muito tempo é administrada por uma empresa particular e não pelos membros que não fica sabendo de nada do $$$ que entra e que sai, que são apenas idiotas que dão os dízimos e sustenta a família Valadão que não tinha nada na vida e hoje, nunca trabalharam em empresas particular fora da igreja, e estão milionários as custas dos dízimos e ofertas.
    Falo isso e provo no que falo, porque sou de BH MG e já frequentei esta igreja desde pequeno aos meus 8 anos de idade, e hoje tenho 54 anos de idade ok?
    Quando frequentei esta igreja, não era assim não, os era os membros que dava as ordens, e tudo que o pastor fazia tinha que dar satisfação em assembléia com os membros. Hoje esta igreja Batista da Lagoinha virou uma empresa ok?
    A Polícia Federal já investigou o pastor Márcio Valadão que é líder dessa igreja por enriquecimento ilícito, e ele foi processado, e o processo corre em juízo.
    Não sejais ingênuo, sejais sábio, as igrejas a maioria delas são empresas que tem dono o pastor líder e etc, e não dos membros que são apenas vaquinhas de presépio nas mãos desse pastores lobos devoradores.
    Hermes sua igreja a Reina não está nesta aí máfia aí, tá? Tomara que não.´

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  3. Anônimo9:13 PM

    A Eva, a primeira a se empoderar curtiu, tristes tempos de apostasia estamos vivendo ... vem Jesus !

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  4. Bispo Hermes! Que bacana! É nisso que eu creio como diz o nosso irmão André. Sem palavras. Estou lendo tomando um chimarrão (já acostumei ehehe) e batendo palmas. Que visão!!! Abraço, Fabio

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  5. Anônimo10:32 AM

    Evas e as serpentes curtiram, juntamente com os adãos.

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