Por Hermes C. Fernandes
Ontem, no programa “Agora é tarde” na Band, Rafinha
Bastos perguntou à nova Miss Brasil o que ela faria se ficasse invisível por um
momento. Sem querer desperdiçar a piada, o comediante se valeu do
constrangimento da moça e respondeu que aproveitaria para entrar
sorrateiramente em seu banheiro enquanto ela estivesse se banhando. Trata-se de
uma fantasia comum a todos os meninos. Quem nunca se imaginou invisível para invadir
o banheiro das meninas para assisti-las em sua intimidade?
Se para uns, a invisibilidade seria um dom, para outros,
é uma maldição. Por que eu disse “é” em vez de “seria”? Afinal, ninguém
inventou ainda o tal manto de invisibilidade, certo? Mas quem disse que
precisamos de tal artefato para nos sentir invisíveis?
Quem nunca se sentiu assim alguma vez na vida, como um
mero figurante em cenas protagonizadas por quem costuma atrair a luz dos
holofotes? Há, porém, pessoas que se
sentem invisíveis o tempo inteiro. Às vezes é necessário um esbarrão para que
sejam devidamente notadas. Mesmo dentro de casa passam despercebidas pela
própria família. No trabalho não passam de um prontuário. Na escola é só mais
um nome na lista de chamada.
O mundo não sabe o que está perdendo ao deixar escapar o
privilégio de enxergar estas preciosidades. O fato de sentirem-se invisíveis
fez com desenvolvessem certas habilidades que geralmente faltam nos demais. Dentre
elas, a transparência. Justamente por não serem detectadas pelos radares
sociais, não estão preocupadas em esconder nada. Seus sentimentos estão sempre
à flor da pele. Não se importam de serem julgadas pelo simples fato de nem
sequer serem notadas. Por isso, não costumam fazer média com ninguém. Os
invisíveis são seres autênticos. São o que são. Dizem o que pensam, pois não
temem a repercussão de suas opiniões; expressam o que sentem, pois não temem a
censura de suas paixões. Em outras palavras, os invisíveis são verdadeiramente
livres.
Sorte tem quem é capaz de percebê-los, desfrutando da
transparência de seus sentimentos. Suas gargalhadas costumam viciar já no
primeiro contato. Basta um único dia sem ouvi-las e a gente tem crise de
abstinência. Quando lágrimas brotam de seus olhos, sentimos como se uma navalha
nos cortasse por dentro, fatiando-nos a alma. Tudo isso, porque os invisíveis
não representam papéis. Tudo neles é visceral. Tudo neles é pra valer. Nada é decorado. Daí serem deliciosamente imprevisíveis.
Raro é encontrar que não seja invisível, e ainda assim é
completamente transparente. Raro, porém, não impossível. Geralmente,
desenvolvem este dom no contato com os invisíveis. Deixam-se contagiar por sua
autenticidade latente.
Igualmente raro é encontrar quem seja invisível, mas que não
tenha desenvolvido o dom da transparência. São seres hermeticamente fechados ao
mundo, que se privam das mais ricas experiências que a vida pode proporcionar.
Na maioria das vezes, são pessoas que foram profundamente feridas. Para se
precaverem de outras dores, fecharam-se como uma concha, escondendo aos olhos
dos demais verdadeiras pérolas, fruto de suas desventuras. Não adianta
forçá-las a se abrir. Há que se esperar o tempo certo até que as chagas em sua
alma se cicatrizem, e assim, furtivamente se abram a novas experiências.
Corro o risco de soar piegas, mas devo salientar que só há uma
maneira de enxergá-los: com as lentes do amor. Através delas, quem ‘se acha’
simplesmente desaparece, e quem se perde, finalmente é encontrado. Amor fartamente achado em amizades sinceras, em laços ternos e perenes, em gestos desprovidos de qualquer interesse que não seja o bem do seu semelhante.
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