Por Hermes C. Fernandes
“Rede de Ódio” é um filme polonês recentemente lançado pela Netflix. A trama gira em torno de um estudante de direito expulso da universidade de Varsóvia que ingressa numa empresa de marketing digital cuja especialidade é destruir a reputação de celebridades, empresas e políticos através de perfis falsos nas redes sociais e a disseminação de fake news. Não há como assisti-lo e não relacioná-lo ao cenário político brasileiro atual, com sua máquina de notícias falsas conhecida como “Gabinete do ódio.”
Na trama, o jovem Tomasz Giemza usa suas habilidades para atacar um candidato à prefeitura cujos ideais eram progressistas. O candidato acaba assassinado durante um evento por um hater contratado pelo jovem. O filme retrata com exatidão como o ódio impulsionado pelas redes sociais pode levar a graves consequências na vida real. Coincidentemente, três semanas após o término das filmagens, Paweł Adamowicz, político liberal polonês, prefeito de Gdańsk, frequentemente alvo de inimigos virtuais, foi esfaqueado até a morte durante um evento de caridade transmitido ao vivo.
No Brasil, um dos mais recentes alvos da rede do ódio é Felipe Neto, youtuber e influenciador digital que figura entre os mais populares do mundo, cujo canal no youtube já teve mais de 10 bilhões de visualizações e quase 40 milhões de seguidores. Bastou que ele usasse suas redes sociais para criticar o atual governo brasileiro, e que aparecesse no The New York Times referindo-se a Bolsonaro como “o pior presidente do mundo” no trato da pandemia da COVID-19, para que o gabinete do ódio apontasse sua metralhadora de fake News em sua direção. Felipe Neto tem tido o seu nome associado à pedofilia, fato que já foi amplamente desmentido. A mesma metralhadora tem sido apontada na direção de artistas como a Xuxa, Chico Buarque, Caetano Veloso, e tantos outros, e até de políticos que abandonaram o barco bolsonarista depois de se desiludirem.
Como se não bastassem os robôs sempre prontos a disparar hashtags e notícias falsas, o gabinete do ódio também conta com artilharia pesada de pastores que não se constrangem em usar suas próprias redes sociais para espalhar boatos e destruir reputações. Alguns demonstram maior lealdade ao governo do que ao seu próprio chamado ministerial. Com isso, a igreja evangélica perde não apenas fiéis, mas também credibilidade e relevância. Qualquer um que se atreva a atravessar seu caminho, desafiando sua agenda moralista hipócrita e se opondo aos seus interesses políticos, deve ser massacrado sem misericórdia. Nem que para isso, tenham que vasculhar o passado de seus desafetos, fazendo o papel do diabo, o acusador.
Bem fariam se recordassem das célebres palavras de Jesus: “Quem com ferro fere, com ferro será ferido.” Desafio-os a desertar das fileiras bolsonaristas para ver o que lhes acontece. Se não pouparam alguns dos pilares de sua funesta campanha eleitoral baseada em mentiras, o que não farão a pastores que se arrependerem de negociar o evangelho transformando-o em discurso de ódio? Mas pelo jeito, isso está longe de acontecer. Enquanto o governo garantir que os interesses desses profetas palacianos sejam atendidos, dificilmente um deles se arrependerá. A consciência de muitos está cauterizada. Seus olhos, vendados. Seus ouvidos, tapados. Seus punhos cerrados, prontos a desferir contra os que se insurgem pela justiça e pela verdade. Enquanto pastores se associam ao desgoverno, vozes proféticas ecoam nas redes sociais através dos lábios e dos posts de pessoas como Felipe Neto, Gregorio Duvivier, Emicida e tantas outras.
O que me traz algum alento é saber que nem todo joelho se dobrou a este ídolo de carne e osso. Entre os pastores, há muitos comprometidos com o evangelho a ponto de arriscarem suas reputações. Poderia citar alguns nomes aqui, mas não o farei com receio de cometer alguma injustiça. Minha esperança é de que a igreja evangélica brasileira sobreviva a estes tempos odiosos, fazendo coro com os que clamam por justiça e não com os que alimentam o ódio e o preconceito.
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