Por Hermes C. Fernandes
“Um retorno às raízes”, diriam os promotores deste movimento. Seu objetivo é o retorno aos que são considerados princípios fundamentais ou vigentes na fundação de seu grupo.
O fundamentalismo surgiu como um movimento nos Estados Unidos, começando entre os teólogos conservadores presbiterianos no Seminário Teológico de Princeton no final do século XIX, logo se espalhando entre os conservadores batistas e de outras denominações entre os anos de 1910-1920. O propósito do movimento era de reafirmar antigas crenças dos cristãos protestantes que zelosamente as defendiam contra a teologia liberal, alto criticismo, o darwinismo, e outros movimentos que consideravam como ameaçadores ao cristianismo.
Dentre os fundamentos defendidos , nenhum se destacou tanto quando a inspiração da Bíblia pelo Espírito Santo, e sua inerrância e literalidade. A teoria da evolução era contrastada com a descrição da criação contida nos primeiros capítulos de Gênesis. Entre crer que o homem foi resultante de um longo processo de seleção natural ou crer que ele foi literalmente moldado do barro, os fundamentalistas preferiam crer no segundo caso. Em vez de crer que o universo teria cerca de 15 bilhões de anos, tendo sido iniciado com o big bang, preferiam crer que ele não teria mais do que seis mil anos e que teria sido criado em seis dias literais. Para o fundamentalista, sem que estes alicerces sejam garantidos, a fé cristã não se sustenta. Se Adão não foi um personagem real, logo, Jesus não poderia ser chamado de o último Adão.
O Fundamentalismo, portanto, é um movimento pelo qual os partidários tentam salvar a identidade religiosa da absorção pela cultura ocidental moderna, ainda que para isso, recorra à segregação em maior ou menor grau. Algo análogo ao proposto por alguns grupos sectários do tempo de Cristo, tais como os fariseus e os essênios, que tentavam impedir que os judeus cedessem ao processo de helenização de sua cultura. A diferença entre eles era que os fariseus eram uma resistência interna, recusando-se a se ausentar da sociedade, enquanto os essênios preferiram abandonar o convívio social com seus patrícios e formar comunidades à parte. Mesmo entre os cristãos primitivos, haviam os que poderíamos chamar de fundamentalistas, pois propunham um retorno à Lei de Moisés, rendendo-lhes a alcunha de judaizantes. Para estes, um gentio convertido à fé cristã, deveria cumprir as exigências da lei mosaica, tanto quanto um judeu.
Os fundamentalistas creem firmemente que a sua causa é de vital, grave e cósmica importância, vendo a si mesmos como protetores de uma única, reta e distinta doutrina, modo de vida e de salvação. O muro doutrinário erigido pelos fundamentalistas visa proteger a identidade do grupo, não só em oposição a religiões estranhas, mas também contra os modernizadores, os que aderem ao diálogo com outras tradições e com a ciência.
De fato, suas propostas exercem certo poder de atração sobre os que abraçam a fé no evangelho. Parece razoável lutar por sua pureza e pela preservação de sua identidade. Teme-se que a fé se dilua de tal maneira que acabe perdendo sua relevância e credibilidade. O liberalismo teológico e sua proposta de repensar o cristianismo a partir de lentes modernas tornou-se seu arqui-inimigo. O cenário atual das igrejas na Europa é usado como prova de que o liberalismo tende a matar o cristianismo, tornando-o obsoleto. Mas o que parecem desconhecer é que o que minou a credibilidade do cristianismo na Europa foi justamente o apoio dado por cristãos fundamentalistas às agendas políticas de exploração e opressão. Não foram os liberais que apoiaram Hitler, mas os fundamentalistas.
O único retorno que o Cristo pede de Seu povo é uma volta ao primeiro amor (Apocalipse 2:4-5). Não se trata de ter as mesmas opiniões dos cristãos primitivos acerca de tudo, mas de, conforme Paulo, “ter o mesmo sentimento que houve em Cristo” (Filipenses 2:5). Não é possível enxergar o mundo com as lentes pré-modernas. Seria um suicídio intelectual. Porém, como disse Jesus, se nossos olhos forem bons, todo o nosso corpo será luminoso. Deixaremos de ser propagadores de ódio e preconceito, e seremos propagadores da mais subversiva mensagem de Cristo: o amor. Eis o fundamento da nossa fé. Por isso, Paulo afirma que o que importa é a fé que opera pelo amor (Gálatas 5:6).
Em vez de nos fundamentar em dogmas passíveis de revisão, devemos estar ”arraigados e fundados em amor” (Efésios 3:17). Afinal, como concluiu o apóstolo, até mesmo as profecias passarão, mas o que deve permanecer até o fim são “a fé, a esperança e o amor, mas o maior deste é o amor” (1 Coríntios 13:13).
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