Por Hermes C. Fernandes
Um dos maiores desafios enfrentados durante esta quarentena é o desgaste das relações familiares. Pais que antes só viam os seus filhos após o expediente de trabalho, agora têm que conviver com os mesmos desde a hora em que acordam até a hora de dormir. Casais que passavam o dia na expectativa de se reencontrarem após o expediente, agora sofrem sob o insuportável peso da rotina. Famílias do mundo inteiro estão experimentando uma espécie de overdose familiar. Se antes o lar era considerado um revigorante oásis, hoje está mais para um escaldante deserto. A maioria não vê a hora desta quarentena chegar ao fim.
Não é por acaso que os índices de violência doméstica estão crescendo assustadoramente.
Como evitar o conflito ou o desgaste das relações familiares durante o confinamento?
Apresento abaixo algumas instruções que podem ser úteis para tornar o convívio familiar numa experiência salutar e agradável em tempos de pandemia. Algumas são dirigidas aos pais, outras aos filhos.
• Pais, evitem fazer comparações entre os seus filhos, ou entre a sua família e a família de seu cônjuge ou de seus irmãos, amigos ou vizinhos. O que torna a grama do vizinho mais verde é o olhar de quem nunca está satisfeito com o que tem. Valorize a seus filhos, com todas as suas qualidades e defeitos. Não encoraje a disputa entre eles. Ensine-os o valor da cooperação no lugar da competição.
• Filhos, ajudem a seus pais nas tarefas domésticas. Antes de reclamar da louça que terá que lavar, lembrem-se de que outro teve ainda mais trabalho para preparar sua comida. Só há louça suja, porque há despensa cheia. De que adianta ser um idealista que sonhe em mudar o mundo, se não for capaz de arrumar seu próprio quarto? Quando estiver lavando o banheiro, lembre-se de quantas vezes sua mãe teve que limpar sua caca. Não esperem que seus pais lhe peçam para fazer alguma coisa. Tomes a iniciativa. Surpreendam.
• Pais, não transformem as tarefas domésticas em castigo, nem recompense seus filhos por fazê-las. Eles precisam aprender que um ambiente limpo e aconchegante depende do esforço conjunto de todos. A recompensa é o bem-estar dos que dividem o mesmo espaço. Se vocês vivem reclamando das atividades domésticas, eles a verão como um peso, algo de que devam se esforçar para escapar. Os filhos tendem a reproduzir o comportamento dos pais dentro de casa.
• Filhos, respeitem a privacidade de seus pais. Se vocês preencherem todo o tempo deles, eles não terão tempo um para o outro, fragilizando a relação. Não entrem em seu quarto sem permissão, nem abram a porta sem bater. Se eles estiverem discutindo por alguma razão, saiam de perto. Se estiverem sussurrando um ao outro, não perguntem o que estão dizendo.
• Pais, não falem mal um do outro na frente dos seus filhos, nem tampouco entrem em uma espécie de “queda-de-braço” para ver que tem maior autoridade ou influência sobre eles. Tampouco desautorizem o parceiro. Jamais perguntem a quem eles amam mais.
• Filhos, quando forem disciplinados por um dos seus pais, não recorram ao outro em busca de consolo ou apoio. Tentar fazer com que um tome partido por vocês em detrimento do outro poderá transformar o lar em um terreno minado. Ninguém ganha com isso. Todos perdem. Aceitem a disciplina sem questionar. Ela visa o seu próprio bem.
• Pais, não escondam de seus filhos os seus erros do passado. Ensine-os a aprender com eles tanto quanto com os seus acertos. Se crescerem imaginando que vocês são super-heróis, e eventualmente vocês cometerem um equívoco, sua frustração será tão grande que poderá transformar a admiração que nutriam em mágoa e até ódio. Mas se perceberem desde cedo o quão humanos vocês são, isso os poupará de muita dor no futuro e os fará admirá-los justamente por sua sinceridade e humanidade.
• Filhos, não esperem perfeição de seus pais, nem justifiquem seus erros nos erros deles. Eles já carregam peso demais pela responsabilidade de suas próprias escolhas. Aprendam a lidar com seus próprios equívocos e não se gabem de seus acertos, como se os fizessem melhores do que seus pais. Cada um tem um caminho a percorrer até alcançar a maturidade.
• Pais, aprendam a elogiar os seus filhos quando acertarem, e não apenas a criticarem ao errarem. Realcem suas virtudes, mas não façam vista grossa às suas vicissitudes. Ninguém é tão bom que não precise ser corrigido. Disciplinar também é uma maneira de expressar seu amor por eles. Quem ama se importa, e quem se importa, corrige.
• Filhos, amem e respeitem a seus pais, independentemente de seus defeitos ou qualidades, lembrando-se de que um dia eles já não estarão aqui. Jamais deixem de expressar quanto vocês os amam, tanto em palavras, quanto em gestos.
• Pais, não esperem que seus filhos recapitulem sua própria história, nem queiram poupá-los de experiências amargas que vocês tiveram que passar um dia. Deixem que passem pelo que tenham que passar para que alcancem a maturidade por eles mesmos. Não tentem poupá-los da frustração, pois ela os preparará para os “nãos” que o mundo lhes dará.
• Filhos, ouçam a seus pais. Tantos os seus conselhos, quanto suas histórias, suas angústias, seus anseios. Demonstrem interesse por tudo o que eles têm a dizer.
• Pais, não exijam de seus filhos a perfeição que vocês não tiveram quando tinham a idade deles. Em vez de tentar dar aos filhos o que vocês não tiveram quando criança, ensine-os a valorizar o que realmente tem valor.
• Pais e filhos, palavras como “por favor” e “muito obrigado” devem ser usadas sem qualquer moderação. A gratidão brota do reconhecimento de que o que outro fez não foi mera obrigação, mas um gesto de amor gratuito e voluntário.
• Pais e filhos, de vez em quando, desliguem a TV, o computador, o celular, e reservem um tempo para conversar, jogar, compartilhar experiências e, sobretudo, orar juntos.
• Pais e filhos, se eventualmente pegarem uma mentira de um dos membros da família, antes de confrontá-lo e repreendê-lo com amor, perguntem-se a si mesmos se a razão de ele haver mentido não se deve à maneira como vocês reagem à verdade. A verdade é sempre bem-vinda em ambientes permeados pelo genuíno amor, onde todos se sentem absolutamente confortáveis em expor o que há no coração, sem receio de perder o carinho e o respeito dos demais.
• Pais e filhos, exercitem o perdão cotidianamente. Não deixem que mágoas e ressentimentos se acumulem. Feridas não se cicatrizam com o tempo. Jamais durmam sem perdoar ou pedir perdão uns aos outros, pois nunca se sabe se acordaremos no dia seguinte.
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