Por Hermes C. Fernandes
O caminho ideal para o prazer sexual é a dois e não sozinho. Entretanto,
o autoerotismo é uma prática muito mais presente do que geralmente ousamos admitir.
Como cristãos que almejam viver dentro de um padrão moral compatível com a
proposta do evangelho, resta-nos perguntar: Afinal, masturbar-se é ou não
pecado? O que a Bíblia diz sobre o assunto? A resposta é: nada. Não há uma
única linha em todo livro sagrado tratando desta prática que tem sido tão
aviltada por cristãos ao longo dos séculos. Já houve até quem preferisse se castrar a deixar-se vencer por esta 'tentação'.
O termo técnico usado para a masturbação é onanismo,
devido a uma interpretação equivocada do episódio em que Onã foi severamente
castigado por Deus por interromper o coito, derramando seu sêmen no chão.[1] Bem da verdade, Deus não o castigou
simplesmente por interromper o coito e desperdiçar seu sêmen, e sim por se recusar
a deixar descendência a seu irmão. Naquela época, quando um homem morria sem
deixar filhos, cabia ao seu irmão desposar a viúva, de modo que o fruto daquele
relacionamento fosse contado como pertencente ao falecido, provendo-lhe, assim,
um herdeiro. Não havendo descendentes, a herança ficava para o próprio
irmão. Onã aceitou desposar a cunhada, mas não quis perpetuar o nome do
irmão (era assim que se falava à época).
Ele quis desfrutar dela, mas sem honrar a memória de seu irmão. Sem
filhos que pudessem herdar os bens do pai, a viúva poderia ficar desamparada. Portanto,
a questão não envolvia lascívia, e sim egoísmo e avareza. Além do mais,
Onã não estava se masturbando, e sim interrompendo o coito. Não há qualquer outra passagem bíblica que fale direta ou indiretamente sobre ejacular fora da
relação sexual.
Diante do silêncio da Bíblia, como deveríamos nos posicionar? Em
decorrência disso, creio que tenhamos liberdade de lançar mão de outras fontes
para determinarmos se a masturbação seria ou não uma prática nociva. Dentre
estas fontes, eu destacaria a ciência.
A masturbação é um fenômeno comportamental que pode ser verificado em
pessoas de todas as faixas etárias. Na infância ela surge como uma forma de
descoberta progressiva do corpo, e é considerada pelos psicólogos como uma fase
natural da evolução da sexualidade. Ninguém deve tocar alarde por flagrar uma
criança brincando com seus órgãos genitais. Isso é simplesmente natural. Mas é
na adolescência que a masturbação atinge sua maior incidência. Essa fase é
caracterizada por uma explosão dos hormônios, que faz com que o adolescente se
sinta impulsionado a se masturbar frequentemente. Foi-se a época em que bastava alegar que a
prática da masturbação dá espinhas, ou provoca qualquer tipo de anomalia
psíquica, para convencer nossos jovens de evitá-la. Quem se propuser a
dissuadi-los da prática, terá que abalizar seus argumentos. Vivemos na era da
informação!
Proponho que façamos uma breve análise à luz da ciência e do espírito do evangelho.
Os sexólogos são unânimes em dizer que a masturbação faz parte de uma
vida sexual saudável, sendo totalmente segura e inofensiva. Recente estudo
revela que homens que ejaculam mais de cinco vezes por semana tem 33% menos chance
de desenvolver câncer de próstata. Muitas toxinas responsáveis por doenças
ficam alojadas no trato urinário. Através da ejaculação, o organismo expulsa
tais toxinas do corpo. Obviamente, um homem que não tenha vida sexual ativa
estará bem mais vulnerável a desenvolver uma doença a partir destas toxinas,
caso não recorra ao hábito da masturbação. Ademais, a masturbação também
ajudaria a resolver dois pesadelos de muitos homens: a incontinência e a disfunção erétil,
evitando a ejaculação precoce e fortalecendo a imunidade. E não são apenas os
homens que se beneficiariam com a masturbação. Além de ser considerada pelos
sexólogos uma ótima maneira da mulher conhecer o próprio corpo e suas zonas
erógenas, ajudaria também na prevenção de infecções. O orgasmo ajuda no
alongamento dos músculos do colo do útero, contribuindo para a eliminação do
muco cervical contaminado por bactérias que podem causar infecções vaginais.
Pesquisas sugerem que esta atividade previne a endometriose, doença responsável
pela infertilidade feminina. Previne também a incontinência da mulher, reduz as
cólicas menstruais, alivia o estresse, libera dopamina, hormônio responsável
pelo prazer e o bem estar. Ajuda na liberação do hormônio prolactina, que
auxilia a mulher a ter um sono de melhor qualidade.
Todos esses benefícios podem ser atribuídos ao orgasmo obtido no
intercurso sexual e não propriamente à masturbação em si. O problema é que nem
todos são sexualmente ativos.
Um jovem cristão que tenha optado pelo celibato até o casamento não tem
como usufruir de tais benefícios senão através da masturbação. E é aí que surge
o conflito, pois ele é exaustivamente orientado a evitar a prática por ser considerada
pecaminosa.
E o que dizer de indivíduos adultos sem vida sexual ativa? Como lidar
com a pulsão sexual estando viúvo ou divorciado? Seria errado recorrer à
masturbação em busca de alívio momentâneo?
Pastores fazem coro ao condenar a prática como sendo nociva à alma, pois
estimularia a lascívia e o adultério. Afinal, dizem eles, ninguém se masturba
pensando em Deus ou em futebol, ou em coisas que não sejam reprováveis pela moral cristã. Se
Jesus disse que bastaria que o homem olhasse para uma mulher cobiçando-a em seu
coração e já estaria em adultério, logo, quem alimenta fantasias sexuais
durante a masturbação também estaria pecando. Seria este um argumento bem
embasado?
O vocábulo grego traduzido por “mulher” nessa passagem é gyné que significa “mulher desposada”[2].
Desejar a mulher alheia é um dos pecados condenados nos dez mandamentos. Masturbar-se
não é apenas tocar-se ou friccionar o órgão genital. Isso por si só não seria
suficiente para levar a pessoa ao orgasmo. É necessário que sua mente se deixe
levar por fantasias sexuais. Mas desde quando estas fantasias devem ser com
alguém casado?
Digamos que o marido seja privado de ter relação com sua esposa, seja
por estar viajando por muitos dias, ou por ela estar de resguardo, seria errado
ele se masturbar pensando nela?
E quanto aqueles cujos cônjuges ficaram inutilizados devido a uma
enfermidade ou acidente? Seria errado recorrer a este expediente? Não seria
melhor isso do que trair o cônjuge ou mesmo trocá-lo por alguém saudável?
E no caso de um jovem que “escolheu esperar”? Enquanto espera, o que
fazer com os efeitos provocados pelos hormônios em seu corpo? Alguns têm a
sorte de descarregá-los durante os sonhos nas chamadas poluções noturnas. E
quanto aos que não têm?
Seria errado se uma viúva se masturbasse pensando naquele que foi o
grande amor de sua vida? Ou não seria cruel privá-la disso em nome de uma moral
deturpada e hipócrita?
Conheci um missionário estrangeiro que enquanto viajava recorria ao chá
de erva doce ou camomila para manter-se calmo ante a privação sexual decorrente
da ausência de sua esposa. Ele teria pecado se durante o banho recorresse à masturbação? Estou convencido que não.
Apesar de tudo o que expus até aqui, devo salientar o perigo que há em
tornar este hábito num vício, numa espécie de prisão. A diferença entre o remédio e o veneno
está na dose. Assim como as Escrituras não condenam comer, e sim a glutonaria,
nem condenam dormir, e sim a preguiça, posso garantir que elas também não
condenem a masturbação, e sim o seu vício.
Há pessoas que mesmo casadas e tendo seu cônjuge disponível, preferem
recorrer à masturbação em busca de prazer. Mesmo que isso não seja nocivo ao
corpo, poderá ser devastador à alma. Geralmente, este vício está ligado ao uso de
material pornográfico fartamente disponível na internet. A pornografia cria expectativas mirabolantes
que nem sempre são alcançadas pelo parceiro, levando a pessoa à frustração. Não
há nada de errado em fantasiar, estimular o parceiro com carícias, buscar
variar o ambiente ou mesmo a posição sexual, desde que isso não viole a
consciência da pessoa amada. Como disse no início deste post, o ideal é que o
prazer seja a dois, numa via de mão-dupla, onde a satisfação do outro seja
nossa prioridade. O maior problema da
masturbação quando estimulada por material pornográfico não é a lascívia, mas o
egoísmo. Aliás, lascívia nada mais é do que a busca do prazer pelo prazer, de
maneira egoísta, sem preocupar-se com a satisfação do outro.
Alguns homens recorrem à masturbação antes de se relacionarem
sexualmente com sua parceira para evitar a ejaculação precoce e assim privá-la
do orgasmo. Não se pode dizer que estes ajam movidos por egoísmo, e sim por
altruísmo.
Como vimos, em se tratando de sexualidade, nem tudo é preto no branco.
Há sempre uma área cinzenta que devemos considerar antes de sair por aí condenando
hipocritamente uns aos outros.
Se eventualmente, você incorrer nesta prática, não se deixe consumir pela culpa. Se o coração lhe condena, lembre-se de que "maior é Deus do que o nosso coração".[3] Mas poupe sua mente do lixo pornográfico. Peça ao Espírito Santo para fazer uma faxina em sua alma e procure direcionar todo o seu desejo para a pessoa amada e não para si mesmo.
_____________________
[1] Gênesis
38:9-10
[2] Mateus 5:28
[3] 1 João 3:20