Por Hermes C. Fernandes
A polêmica em torno do filme “Como se tornar o pior aluno da escola”, baseado no livro homônimo de Danilo Gentili fez com que eu me dignasse a perder quase duas horas de meu domingo diante da TV. Não queria emitir qualquer opinião sem antes saber do que se tratava. Deparei-me com uma peça cinematográfica de péssimo gosto, com cenas absolutamente inapropriadas envolvendo atores e personagens menores de idade. Dentre as mais grotescas, a que mais chamou a atenção do público foi a cena de conotação sexual envolvendo o personagem interpretado por Fábio Porchat e dois adolescentes. Há também a cena de uma briga entre um dos adolescentes e o personagem representado por Danilo Gentili em que parte de sua genitália é esfregada na boca do menino. Além de encorajar situações libidinosas entre adultos e menores, o filme também apela à gordofobia e a outros tipos de bullying.
Apesar de ter sido lançada em 2017, quando recebeu apoio de figuras conservadoras proeminentes como Ratinho e Marco Feliciano, somente agora, com o seu lançamento para o grande público na Netflix, a película causou burburinho nas redes sociais. Houve quem salientasse a hipocrisia dos mesmos críticos de ocasião que antes aplaudiam Gentili, visto que à época era apoiador do então candidato Jair Bolsonaro. Dado o constrangimento por seu histórico de apoio ao presidente, alguns miraram suas críticas no ator Fábio Porchat que protagoniza a cena mais polêmica, responsabilizando seu viés progressista (mesmo que este tenha demonstrado desconforto e relutância em interpretar o papel, sendo convencido por Gentili que apelou para cenas similares em um filme americano, garantindo que seria divertido).
Os mesmos conservadores que não poupam Xuxa Meneghel por haver encenado ao lado de um adolescente no início de sua carreira (o que ela já veio à público esclarecer diversas vezes), passaram pano para Gentili, verdadeiro responsável pelo enredo do filme em que Porchat entrou de gaiato (o que não diminui sua responsabilidade).
O pastor e deputado Marco Feliciano correu para apagar um tuite em que afirma que havia tempos que não ria tanto. Ao perceber que a emenda ficou pior que o soneto, Feliciano se justificou dizendo que teria apagado o tuite onde elogiou o filme de Danilo Gentili e que não se recordava da cena em que faz apologia à p&d#f*l*@. “Devo ter saído p/ atender telefone. Se tivesse visto faria o q sempre fiz c/outros filmes, teria denunciado.”
Pergunto-me se o tal telefonema não teria sido do Ratinho, outro conservador apoiador de Bolsonaro que posou ao lado do cartaz do filme.
Não sou puritano. Não me constranjo diante de cenas fortes. Mas jamais poderia me calar diante de algo de tão grande mau gosto, capaz de influenciar nossos filhos a acreditar que o envolvimento entre um adulto e um menor é absolutamente natural, como afirma o personagem vivido por Porchat. Aliás, apesar de admirá-lo como humorista, devo admitir meu desapontamento. Espero que venha à público demonstrar algum tipo de arrependimento, o que, sinceramente, não espero da parte de Danilo Gentili, que, aliás, deixou claro em um tuite a sua satisfação com a polêmica gerada por sua obra. “O maior orgulho que tenho na minha carreira é que conseguir desagradar com a mesma intensidade tanto petista quanto bulsonarista. Os chiliques, o falso moralismo e o patrulhamento: veio forte contra mim dos dois lados. Nenhum comediante desagradou tanto quando eu. Sigo rindo.”
Enquanto ele segue rindo, muitos seguem chorando, vítimas de bullying e de abusos sofridos na infância.
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