Por Hermes C. Fernandes
Nenhuma outra figura do Novo Testamento provoca tantas
especulações do que ela. E não pensem que isso seja um fenômeno recente. Já
desde os primórdios da igreja, Maria Madalena causava certo incômodo aos
discípulos mais chegados de Jesus.
Ela é usualmente confundida com a prostituta que lavou os
pés de Jesus ou com a mulher flagrada em adultério que por pouco não foi
apedrejada. Mas dentre todas as
confusões envolvendo seu nome, nenhuma é maior do que a que afirma que ela teria
sido esposa de Jesus.
Haveria alguma possibilidade, ainda que remota, que tal
hipótese fosse confirmada?
Teorias de conspiração afirmam que Maria Madalena estaria
grávida de Jesus durante sua crucificação. Fugindo a perseguição dos judeus,
ela teria conseguido escapar para o sul da França, onde deu à luz uma
menina. O verdadeiro Santo Graal não
seria um cálice no qual os discípulos beberam o vinho na última ceia, como
dizem as lendas do rei Arthur, mas sim o corpo de Madalena, no qual era gerado
Seu descendente. Como se bastasse, a
igreja católica teria feito de tudo para manter o segredo capaz de sacudir seus
alicerces. Óbvio que uma teoria mirabolante
como esta renderia milhões na venda de livros e em produções cinematográficas
como “O Código da Vinci” de Dan Brown.
Em que se baseia tal teoria?
As principais fontes seriam, sem dúvida, os evangelhos
apócrifos e gnósticos, cuja autoria e historicidade são duvidosas. Não que eles
digam diretamente que Maria Madalena fosse esposa de Jesus, mas apresentam
indícios de que eles teriam um caso amoroso. Um desses textos gnósticos é o
Evangelho de Filipe, onde os discípulos teriam perguntado a Jesus porque Ele a
amava mais do que a eles. Também é dito que Jesus a beijava na boca com
frequência.
Como cristãos, devemos ter certa cautela com textos
apócrifos, principalmente quando estes
vão além do que está registrado nas Escrituras. E o que estas, afinal, dizem? Haveria nelas algum indício que Jesus pudesse
ter se envolvido romanticamente com Madalena?
Geralmente, as mulheres eram conhecidas pelo nome de seus
maridos. Maria foi a única conhecida pelo lugar de proveniência. “Madalena”
significa “de Magdala”, uma vila de pescadores que ficava a 10 quilômetros de
Cafarnaum, na costa ocidental do Mar da Galileia. Provavelmente, era uma pessoa de destaque em
sua cidade.
Tinha recursos que a tornavam independente, o que era raro
para uma mulher naqueles dias. E a maior evidência disso é que ela estava entre
as mulheres que financiavam o ministério de Jesus, figurando ao lado de Joana,
mulher de Cuza, procurador de Herodes.[1]
Sem dúvida, era uma mulher à frente de seu tempo.
Jesus foi o único mestre de Sua época a recrutar mulheres
como discípulas. [2]
Ele nem mesmo se importava em ser flagrado conversando com uma mulher de moral
duvidosa como a samaritana que encontrou à beira de um poço.
Mas daí dizer que Ele teria tido um romance seria pedir
demais.
Eis as razões porque
Maria Madalena não poderia ter sido esposa de Jesus:
1 - Jesus sabia desde o início qual era a Sua missão e como
teria que dar Sua vida pela redenção do mundo. Seria, no mínimo, uma
irresponsabilidade envolver-se romanticamente com uma mulher sabendo que a
deixaria em seguida, já que Sua missão exigia isso.
2 – Na cena da cruz, Jesus não teria se preocupado apenas com
Sua mãe, designando um discípulo para cuidar dela em Sua ausência, mas também
com o futuro de Sua esposa e eventuais filhos.
3 - Se Maria Madalena fosse esposa de Jesus, ela teria sido
consultada quanto ao lugar onde Seu corpo seria sepultado. Portanto, não
precisaria ficar à espreita para descobrir, conforme lemos abaixo:
“Chegou José de Arimatéia,
senador honrado, que também esperava o reino de Deus, e ousadamente foi a
Pilatos, e pediu o corpo de Jesus. E Pilatos se maravilhou de que já estivesse
morto. E, chamando o centurião, perguntou-lhe se já havia muito que tinha
morrido. E, tendo-se certificado pelo centurião, deu o corpo a José, o qual
comprara um lençol fino, e, tirando-o da cruz, o envolveu nele, e o depositou
num sepulcro lavrado numa rocha; e revolveu uma pedra para porta do sepulcro. E
Maria Madalena e Maria, mãe de José, observavam onde o punham.” Marcos 15:43-47
Por que Maria
Madalena não poderia ser a mulher flagrada em adultério?
· Porque para isso, teria que ser casada. E se o
fosse, seria conhecida pelo nome de seu marido e não de sua cidade de origem.
Por que Maria
Madalena não poderia ser a prostituta que ungiu a Jesus com seu perfume?
Se ela já houvesse ungido Jesus para o Seu sepultamento, não
teria achado necessário ungi-lo novamente, já que aquela “unção” foi explicada por
Jesus como sendo um embalsamento pré-sepultamento.
“Ora, derramando ela este unguento
sobre o meu corpo, fê-lo preparando-me para o meu sepultamento.” Mateus 26:12
“E, passado o sábado, Maria
Madalena, e Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem ungi-lo.
E, no primeiro dia da semana, foram ao sepulcro, de manhã cedo, ao nascer do
sol.” Marcos 16:1,2
Maria Madalena foi, sem qualquer sombra de dúvida, uma das mais importantes seguidoras de Cristo. Tanto que foi a primeira a vê-lo
após a Sua ressurreição, antes mesmo de Pedro e João.
“E no primeiro dia da semana,
Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu a pedra
tirada do sepulcro. Correu, pois, e foi a Simão Pedro, e ao outro discípulo, a
quem Jesus amava, e disse-lhes: Levaram o Senhor do sepulcro, e não sabemos
onde o puseram.” João 20:1,2
Apesar de sua inquestionável importância, os demais
discípulos pareciam não dar-lhe tanto crédito, questionando até sua sanidade mental:
“E, voltando do sepulcro,
anunciaram todas estas coisas aos onze e a todos os demais. E eram Maria
Madalena, e Joana, e Maria, mãe de Tiago, e as outras que com elas estavam, as
que diziam estas coisas aos apóstolos. E as suas palavras lhes pareciam como
desvario, e não as creram.” Lucas 24:9-11
Numa cultura machista como aquela, a palavra de uma mulher
não gozava de muita credibilidade. Mas foi justamente ela que recebeu do Senhor
a missão de anunciar aos outros discípulos a Sua ressurreição. Ela recebeu o “ide”
bem antes dos demais:
“E Maria estava chorando fora,
junto ao sepulcro. Estando ela, pois, chorando, abaixou-se para o sepulcro. E
viu dois anjos vestidos de branco, assentados onde jazera o corpo de Jesus, um
à cabeceira e outro aos pés. E disseram-lhe eles: Mulher, por que choras? Ela
lhes disse: Porque levaram o meu Senhor, e não sei onde o puseram. E, tendo dito
isto, voltou-se para trás, e viu Jesus
em pé, mas não sabia que era Jesus. Disse-lhe Jesus: Mulher, por que choras?
Quem buscas? Ela, cuidando que era o jardineiro, disse-lhe: Senhor, se tu o
levaste, dize-me onde o puseste, e eu o levarei. Disse-lhe Jesus: Maria! Ela,
voltando-se, disse-lhe: Raboni, que quer
dizer: Mestre. Disse-lhe Jesus: Não me detenhas, porque ainda não subi para meu
Pai, mas vai para meus irmãos, e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso
Pai, meu Deus e vosso Deus. Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos que
vira o Senhor, e que ele lhe dissera isto.” João 20:11-18
Se há uma cena que poderia parecer sugestiva de que houvesse
algo a mais entre Jesus e Madalena, esta cena é a descrita acima. No texto
original, lemos que Maria Madalena literalmente agarrou Jesus. Se um dos Seus
discípulos o flagrasse naquele instante, certamente maldaria, como fizeram ao
flagrá-lo de conversa com a mulher samaritana. Porém, Jesus nunca se importou
com os escrúpulos moralistas de Seus discípulos. Todavia, Ele a repreendeu, não
por agarrá-lo, mas por tentar impedir que Ele seguisse em Seu caminho.
Sim, Maria Madalena era esposa de Cristo, assim como todo
aquele que tendo n'Ele crido, tornou-se parte de Seu Corpo Místico, a Igreja.
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