Por Marina Silva
Em 1988, ano em que seria assassinado, Chico Mendes retornou ao Acre depois de uma viagem e escreveu, ainda no avião, uma carta endereçada aos jovens do futuro. Imaginava outro mundo possível, depois de um passado de dor e sofrimento. Como estariam os pais daqueles jovens do futuro? Não custa sonhar…
Junho de 2092. Comemoramos os cem anos da conferência do Rio de Janeiro, que aprofundou os debates e acordos internacionais para deter o aquecimento global e os grandes desastres ambientais que ameaçavam o equilíbrio do planeta e as condições que promovem e sustentam a vida.
Durante vinte anos, obtivemos poucos avanços e os problemas se acumularam. Até que, em 2012, no Rio de Janeiro e espalhada pelo mundo inteiro, a sociedade, em toda a sua diversidade, fez escutar suas vozes de alerta e escolheu fazer uma guinada na civilização que começou quando os representantes dos governos, reunidos na Rio+20, assumiram suas responsabilidades diante do futuro.
Reconheceram, no relatório divulgado pela Agência da ONU para o Meio Ambiente, que tinham falhado em quase todos os acordos e metas que haviam assumidos naqueles vinte anos desde a primeira conferência no Rio. Fizeram uma revisão dos 90 pontos do acordo e se comprometeram a retornar aos seus países com a decisão de corrigir o atraso.
Em seguida, divulgaram um documento fortemente influenciado pelo alarme emitido pela ciência e pelas manifestações da juventude, de povos indígenas, populações tradicionais e militantes da causa ambiental daqueles dias, estabelecendo metas e ações para o desenvolvimento sustentável -que passaram a orientar os governos em suas legislações, acordos regionais, programas e financiamentos internacionais de projetos de desenvolvimento.
Reorientados e com a intensa militância civil, os países encontraram o caminho para superar a crise financeira que os ameaçavam, investindo na recuperação do ambiente e na promoção social, criando novos bens e serviços, o que deu início ao boom virtuoso que salvaguardou a continuidade da vida e o futuro da humanidade.
Mudaram-se, assim, os hábitos, as modas, as técnicas de produção e as tendências de consumo. As pessoas se desintoxicaram de suas arrogâncias e certezas, perceberam-se cada vez mais dependentes umas das outras, desarmaram-se para reconhecer que também podiam ser fortes na fragilidade.
Sonho? Talvez não, se os jovens do futuro fizerem ecoar seu clamor através do tempo, para que seus avós, em 2012, saibam que isso pode ser real.
fonte: Folha de S.Paulo
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