Por Hermes C. Fernandes
Não existe perdão automático. Quem dera houvesse. Quem dera pudéssemos girar uma chave na ignição do nosso coração, e sem que precisássemos nos preocupar em passar qualquer marcha, nosso “carro” se pusesse a andar. Imagine só, um coração com câmbio automático! Tudo seria bem mais simples, não?
Em vez disso, a gente tem que dividir nossa atenção entre o volante e o câmbio. Cada marcha é responsável por liberar a potência do motor, fazendo com que o veículo alcance força e velocidade.
Não dá para ligar o carro e sair de terceira ou de quarta. Estas são marchas de velocidade, usadas quando o veículo já se encontra em movimento. Para fazê-lo sair do lugar, a marcha certa é a primeira, a mais forte, a que mais força o motor. Logo em seguida, com o veículo já em movimento, passamos a segunda, depois a terceira, a quarta e até a quinta.
Assim é o perdão.
Sem perdão, a vida não sai do lugar. Não importa se o tanque está cheio, se suas engrenagens estão devidamente lubrificadas, se os pneus estão calibrados, se a carroceria está limpa. Se não se dispuser a perdoar, o carro permanecerá estacionado.
O problema é que as pessoas são ensinadas a acreditarem num perdão automático, de boca para fora, desprovido de sentimento, de amor, de graça. Seria como uma caixa de marcha sem óleo. Se insistir, ela vai pifar.
Perdão de verdade precisa ser elaborado. E cada indivíduo tem o seu próprio tempo. Assim como não se pode sair de uma marcha para outra sem que o motor indique estar pronto. E isso dependerá a potência do motor. Um bom motorista saberá reconhecer os sinais pelo seu ronco.
Porém, a iniciativa de passar a primeira marcha só depende da vontade do motorista. O motor de um carro parado, mesmo ligado, não vai pedir marcha alguma. Trata-se, portanto, do primeiro passo na elaboração do perdão. A decisão está em nossas mãos.
Deixar de perdoar é contentar-se em ver a vida parada, sem sair do lugar. Negá-lo é o mesmo que se sabotar, submetendo-se a uma dor excruciante e constante. Chega a ser desumano consigo mesmo.
Mesmo quando estamos com nossa bateria arriada, precisando de um empurrãozinho pra ver se a vida pega no tranco, temos que estar com a marcha engatada, caso contrário, todo esforço será nulo. Mas quando o carro pega, o próprio motor em plena rotação se encarrega de recarregar a bateria.
Um carro só se mantém em movimento na banguela (desengatado, sem marcha) se estiver numa descida, ladeira abaixo. Como dizem por aí, pra descer, todo santo ajuda... Nem precisa empurrar.
Depois que a gente passa a primeira, inicia-se um processo de evolução que não pode ser interrompido. O que começa com o perdão, passa pela marcha da compreensão, depois, pela reconciliação, e, finalmente, pela restauração. O que foi danificado pela mágoa, pela injustiça, pela violência, pelo abandono, finalmente é curado. Da ferida, só resta a cicatriz.
Não deixe sua vida em ponto morto.
O tempo está passando.
Não seja injusto consigo mesmo.
Dê-se a oportunidade de perdoar a quem lhe feriu. Mesmo que ele não mereça. Dê o primeiro passo e deixe que o resto siga sua sequência natural. Sem pressa. Sem pressão.
E se, porventura, já decidiu não perdoar, talvez seja hora de passar uma marcha ré. Voltar atrás em algumas decisões precipitadas pode ser a melhor coisa a fazer.
Você só não pode é desperdiçar o resto de sua vida se martirizando ou até mesmo se culpando por algo que lhe foi feito.
A graça de que você necessita para isso já está aí, pulsando em você, esperando que você tome a iniciativa de perdoar.
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