sábado, setembro 04, 2010

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Amor, Poder e Justiça - II

Com a queda do governo militar brasileiro ressurgiu entre os evangélicos brasileiros a discussão sobre a responsabilidade política da comunidade cristã. Foi e é importante para o cristianismo brasileiro que tal discussão se faça, mas ainda faltam aos pronunciamentos evangélicos consciência e maturidade da responsabilidade política que devem ter. A comunidade evangélica ainda tem que ultrapassar a espiritualidade privatizada em direção ao compromisso social efetivo e prático.

Paul Tillich em seu trabalho Amor, Poder e Justiça [1] pode nos ajudar a entender o caminho a percorrer na construção desse diálogo da espiritualidade com a política. Para ele, toda e qualquer política tem sempre uma mesma essência, que é o uso do poder. [2]

“L’être, c’est le pouvoir de l’être. Mais même dans son emploi métaphorique, le pouvoir suppose um objet sur lequel il peut exercer et démontrer son pouvoir”. [3]

Por isso, o poder determina os caminhos da sociedade. E que será chamado de poder político porque recorre à autoridade social instituída e possibilita ao Estado exercer coerção em nome do direito dos cidadãos.

As convicções pessoais acerca da soberania de Deus e do Cristo, que conquista principados e potestades, têm profundas implicações no modo em que pensamos a política. Assim, a espiritualidade privatizada ofusca o caminho a seguir e mascara práticas imorais através de atitudes aparentemente piedosas.

De novo, voltemos a afirmação de Tillich, que de certa forma já tinha sido exposta por Spinoza: não há política sem o uso de poder. Embora tal afirmação seja quase óbvia, é comum encontrarmos cristãos que apresentam propostas sobre o reino de Deus e políticas que buscam uma ordem política onde o amor sem poder possa superar o poder sem amor.

Ao analisar tais propostas, que ressuscitaram no século 20 a teoria social anabatista, que contrapõe as políticas de poder ao amor cristão, vemos que para esses evangélicos é impossível aceitar tais políticas e viver o estilo de vida do Jesus crucificado. Chamam à igreja a criar uma comunidade nova e a rejeitar qualquer forma de violência, representada na ordem econômica e política sob o poder do Estado.

Mas ao rejeitarem as políticas de poder da sociedade, de fato estavam aceitando qualquer uso do poder, pois não defenderam uma retirada do mundo ou um abandono da missão da igreja no mundo. Neste sentido, diferiam dos fundamentalismos separatistas. O que estavam propondo era a subordinação radical dos poderes do mundo ao Cristo. Acreditavam que o fracasso da política criaria as bases para a manifestação do poder de Deus através do testemunho da comunidade cristã, que enquanto agente profético apontava o caminho da redenção do mundo.

Mas o que deve ser reconhecido é que tal pensamento faz crítica política, mas rejeita envolvimento e prática políticas como estratégia. O que em última instância significa uma estratégia apolítica que rejeita o poder, rejeitando também a política.

Ora, se a comunidade evangélica tem uma moral política, deve exercer poder e utilizar os meios que possibilitem chegar aos fins que busca. Rejeitar o poder é rejeitar políticas. Tal rejeição pode até ser aceita, desde que seus agentes tenham clara a opção que estão fazendo. O problema é que fizeram uma opção pela renovação da consciência moral da comunidade evangélica, eles próprios rejeitaram a política como meio de viabilizar a opção social escolhida.

Ora, enquanto a consciência evangélica acreditar que a omissão diante da política e do poder favorece à instalação do reino de Deus, teremos o apoliticismo como política evangélica, e isso só fortalece os grupos instalados no poder. E, ao contrário do que pretendem modernos fundamentalismos, não vai estabelecer neste mundo o reino do Cristo.

Se não é possível falar de política, sem falar de poder, fica uma outra questão, que tem a ver com o pensamento cristão: amor e poder são compatíveis? A pergunta procede porque o cristão e a espiritualidade pós-gregoriana remetem à prática e ao serviço ao próximo. Mas, sabemos que em nome do amor, da espiritualidade e do serviço ao próximo muitos cristãos negam a possibilidade de todo e qualquer poder.

“... pouvoir de l’être n’est pas une identité morte, mais lê processus dynamique dans lequel l’être n’est se separe de lui-même et retourne à lui-même. Le pouvoir,d’autre part, est d’autant plus grand, que la séparation vaincue a été plus grande.Lê processus par lequel est reuni ce qui était separe s’appelle l’amour. Plus il y d’amour réunificateur, plus il y a de non-être vaincu, et plus il a de pouvoir d’être. L’amour est la base, non la négation du puvoir”. [4]

Sabemos, como nos mostra Tillich, que o amor do qual estamos falando é um ato da vontade. Não se pode forçar uma pessoa a amar ninguém. Porém, atos de ordem política contêm elementos involuntários. Assim, porque o poder do Estado é associado com ações que vão ou estão fora de nossa vontade e o ato de amor associado com ações do querer, concluímos que a ação do Estado extrapola o amor porque este não pode ser forçado.

Outro fato importante, é que o amor é algo que deve ser mediado pessoalmente. Como a natureza voluntária do amor necessita a existência de uma pessoa que o ative, o amor sempre é pessoal. O Estado, como qualquer outra ordem social instituída, tem uma existência objetiva e alcança seus fins indiscriminadamente. A relação do cidadão com o Estado é eu/instituição, em lugar da relação eu/você, que possibilita a mediação pessoal que ativa o amor.

Além disso, o amor é sempre sacrificial. Ou seja, possibilita ações que a despeito dos meus interesses particulares, imediatos, responde ao bem-estar do outro. Conscientemente, é um perder para que outro ganhe. Sacrificamos direitos, sem estar forçados por obrigação legal, para que o outro seja beneficiado.

Assim, por ser livremente determinado, o amor vai além de uma obrigação moral ordinária. Cumprir obrigação moral é responder à necessidade moral, é um ato de dever em lugar de um testemunho moral livre. É importante entender que esse processo de ir além da obrigação moral envolve, como paradoxo, uma vontade moral implícita.

Resumindo, podemos dizer que o amor é voluntário e livremente entregue, que envolve volição moral, deve ser mediado pessoalmente, é sacrificial. E, finalmente, o amor vai além do dever ou da obrigação moral, embora implique, paradoxalmente, em obrigação moral ou realização de um dever de origem.

Mas política, por outro lado, envolve servidão involuntária. Sua natureza implica no uso de coerção e força para alcançar seus fins. É organização formal e opera impessoalmente. Os políticos e aqueles que atuam ao nível do Estado se ocupam de ações que levam terceiros ao sacrifício, por isso a necessidade da força e da coerção e, em última instância, do próprio Estado. A maioria da população geralmente se considera satisfeita quando vive sob determinada ordem política que pelo menos responde às exigências de sua obrigação moral. E quando isso não acontece nos sentimos tentados à rebelião contra o Estado, a fim de exigir dele a realização daquilo que consideramos sua obrigação moral. Fazendo assim agimos no sentido de que não se torne totalitário, ou seja, negando os limites de seu poder de Estado ou passando por cima das obrigações que tem com os cidadãos.

Por isso, usar o poder do Estado como meio de realizar o amor entre os cidadãos é um contra-senso, pois não podemos forçar ou coagir ninguém ao amor. Tal coesão destruiria também a obrigação moral do Estado, que baliza a diferença entre poder limitado e governo totalitário.

Dado a dualidade entre poder e amor e o conflito aparente entre poder sem amor e amor sem poder, como nos situaremos frente à política? Colocada a questão nestes termos, de fato é muito difícil escolher entre ser um castrado político, mas cidadão do reino, e ser um político atuante à margem da salvação. Como então seguir o caminho do amor cristão sem rebaixar a nobreza do amor no altar do poder?

Continua...

Jorge Pinheiro (Via metodista.com.br)

[1] Paul Tillich, Amour, pouvoir et justice, Analyses ontologiques et applications éthiques, Revue d’Histoire et de Philosophie Religieuses, Paris, Presses Universitaires de France, 1963 et 1964, números 4 et 5.
[2] Idem, op. cit., no. 4, p. 334.
[3] Idem, op. cit., no. 4, p. 339.
[4] Idem, op. cit., no. 4, pp. 355-356.

2 comentários:

  1. Querido amigo Hermes, que prazer estar aqui!

    João Batista anunciou a chegada de um Reino – e consequentemente de um Rei. Rei, Reino, significa: Cultura, Governo, Política, Leis, Punições... Assim, podemos dizer que o Governo de Deus está aqui e a Palavra(Bíblia) é a Constituição que rege este Reino. Você é um Embaixador deste Reino, um representante deste Reino, um disseminador da Cultura deste Reino...

    Continue cantando a música do Senhor. Seja sempre o arauto...

    Muito bom o seu trabalho aqui e também no youtube. Eu também estou lá – visite-me!

    http://www.youtube.com/watch?v=4O5yCWlFRIE&feature=related

    http://www.youtube.com/watch?v=IjmVVKm6TtQ&feature=related

    Edson Carmo

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  2. Gordom2:57 PM

    Meu irmão Hermes,a paz do Senhor Jesus!
    Hermes,já não basta aguentar o horário político na televisão,agora temos que aguentar,nos blogs estes textos aí de política,se eu não me engano,este já é o segundo texto!
    Todos nos sabemos que os políticos que estão lá,e os que entrarem, não vão mudar nada! Não devemos ser tolos!Os que entrarem não vão fazer nada vezes nada! O sistema é isto que vemos e pronto!Vc já sabem! Não precisa falar!
    Assim não dá!Chega! Lugar do Verdadeiro cristão é pregar o evangelho e pronto!As coisas do mundo não nos pertence.
    Jesus Cristo dise: Eu não sou deste mundo,e o mundo jás do maligno.
    Eu sei que vc não têm nada a ver com isso,mas ficar perdendo tempo,com essa podridão que se chama política não dá.
    Meu irmão Hermes,o que faz bem,é: meditar,ouvir e falar da Palavra de Deus,para os homens perdidos indo para o inferno.
    É isto,que Jesus Cristo quer,e ordenou,pois brevemente o anticristo e a besta tomará o domínio de tudo e só teremos um governo mundial que será comandado por Satanás. Agora ficar perdendo tempo com política AH! Sem Cometários!
    Para mim o viver é Cristo,e o resto para mim e sei que também para outros: É lixo,nuvens que passam.
    Me desculpe,mais é pura Verdade.
    Igual um tal de Parker disse no comentário anterior,que sou ditador.
    Eu não sou ditador,apenas não sou Maria vai com as outras,e nem um bonequinho de marionete,e nem bôbo da côrte,é isto aí! Falo na linguagem que todos possam enterder,e não fico me passando por hipócrita e falsa ovelha!
    Que saudades que tenho das palavras do profeta João Batista,e que hoje não se encontram mais que diz:no livro de Mateus 3.7; E 23.33, E,vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus que vinham aos seu batismo,dizia-lhes: RAÇA DE VÍBORAS,QUEM VOS ENSINOU A FUGIR DA IRA FUTURA?
    SERPENTES,RAÇA DE VÍBORAS!COMO ESCAPAREIS DA CONDENÃO DO INFERNO?
    Meu irmão Hermes,me desculpa a colacação,mas eu não aguento ver tantas pessoas hipócritas falarem mal das igreja que os púlpito é pregação para eleger candidatos,isto todos nos já sabemos; mais este amigo aí que escreveu isto,para mim ele que ser candidato.
    E está aproveitando sutilmente usando o blog, para fazer sua campanha.
    Seria melhor ele fazer sua campanha no púpito das igrejas não é mesmo?É uma Excelente ídeia?
    Meu irmão Hermes,o que eu quero é o seguinte:
    Sim eu amo a mensagem da cruz,até morrer eu à vou proclamar,levarei eu também minha cruz,até por uma coroa trocar. Está coroa Jesus dará aos que vencerem!
    Hermes,Jesus Cristo te abençõe!

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