quinta-feira, agosto 12, 2010

6

O lado escuro do ser

“Dark Side of the Moon” é, sem dúvida, o melhor trabalho do Pink Floyd. Lançado em 1973 tornou-se o terceiro disco mais vendido de todos os tempos, ficando 14 anos consecutivos entre os melhores na parada da Billboard.

Eu, que sempre fui apaixonado pela banda, tive contato com o álbum aos 11 anos de idade, mas só vim entender sua proposta tempos mais tarde... Em suma, tratava-se de um disco conceitual que buscava abordar temas existenciais da década de 1970, entre eles: tempo, dinheiro, drogas, loucura, guerra e morte.

Sem muitos rigores, “Dark Side of the Moon” poderia ser traduzido como “O Lado Escuro da Lua”. Não sei se é mito, mas conta-se que a inspiração para o título veio de uma afirmação do guitarrista Syd Barrett, um dos pioneiros do grupo, que de certa feita afirmou: “todo mundo pode ver a face clara da lua; mas quem pode ver o seu lado escuro?”.

Não é sem motivo que a frase de Barrett sempre me fez lembrar da “Parábola do Publicano e do Fariseu”. De forma livre, “amplificada” por alguns comentários próprios, transcrevi o texto tomando por base a narrativa do Evangelho.

O Fariseu e o PublicanoLucas 18:9-14

Jesus apresentou essa estória a algumas pessoas que se achavam boas e que por isso pensavam ser capaz de promover sua própria salvação, desprezando assim aos demais.

Dois homens se dirigiram ao templo para um momento de oração. Um deles era um simulacro religioso. O outro, gente comum, gente como a gente.

O primeiro, uma espécie de traficante do sagrado, posicionou-se num lugar de destaque e, em voz alta, fez um discurso fraudulento, eloqüente, de si, para si mesmo.

Na sua apologia, tratava de feitos “reluzentes” e agradecia por não ser como os “normais”. Já perto do fim da reza vazia, olhou para trás e viu ao fundo a figura desbotada do homem que com ele viera pelo caminho.

Não satisfeito pelo incômodo já causado ao Divino, para arrematar a pantomima, passou então a comparar-se a “triste figura” dizendo: “Deus, quero ainda te agradecer por não ser como este desqualificado, recebedor de propinas, homem de conluios, adúltero, pois, como bem sabes, sou ser religioso, íntegro nos meus caminhos, jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de todos os meus bens”.

E continuou Jesus... O segundo homem, por outro lado, perfilava-se cabisbaixo e introspecto. Encharcado de dores e dramas, achando-se indigno de aproximar-se do altar, preferiu ficar à porta do templo. Com voz baixa e embargada, recitava sua oração como um mantra e dizia: “Deus, sê propício a mim pecador”.

De fato, ali estava alguém com muitas contradições, um filho da terra, caminhante da vida. Tinha nos pés a poeira da miséria humana, era um escrevente de histórias desconexas e protagonista de muitos equívocos.

O absurdo da parábola, entretanto, e contra toda lógica, é a maneira singular como Deus trata os dramas da alma humana...

E continuou Jesus... Estes dois homens vieram a esta catedral em busca de uma aproximação com o sagrado. Um veio movido pelo desejo de exibir seus “experimentos” religiosos; o outro tragado pela necessidade de ter uma experiência com o transcendente.

O primeiro é reflexo da perpetuação da religião sem significados, calcada em exterioridades, produtora de ritos ocos, portadora de palavras de lisonjas, mas incapaz de materializar algo de concreto na vida. Munido de supostas boas obras, imaginava ter o seu proceder autenticado pelo céu e, em função disso, percebia-se tão reluzente como a lua cheia.

Eis a desgraça perpetrada pela religião: a produção de manequins travestidos de “espiritualidade”, arquétipos da fé institucionalizada. Na sua insensatez, vomitou o que de pior havia em seu ser, expurgou sombras profundas sobre o altar. O que para ele parecia ser luz, para Deus eram apenas trevas.

O segundo homem, por sua vez, é um ser em transformação, que tem na reconstrução de sua consciência seu melhor momento existencial. Percebendo a si mesmo, enxergou-se portador de muitas mazelas. Nem ousou comparar-se a nada em baixo na terra, nem se deu ao desplante de requerer qualquer vantagem do céu. Despido de suas máscaras, nada pediu, a não ser um pouco de paz e perdão.

E Jesus concluiu... Ambos vieram em busca de justificação, mas apenas o segundo foi saciado de sua ânsia de vida. O outro, por sua vez, auto-justificado, indulgente consigo mesmo, portador de uma mente cauterizada pela caducidade da “letra morta”, possuidor de um coração pedrado pelas futilidades da existência, tornou para seu caminhar cheio de si mesmo e esvaziado da presença de algo sagrado.

O que expôs as suas trevas, revestiu-se de luz. O que forjou para si a luz, encobriu-se de sombras, injetou veneno na alma e mergulhou em profunda escuridão.

Nos Bailes da Vida...


Tenho uma questão para nós: quando andamos pela rua, ou estamos no trabalho, sentados no cinema, ou em casa com a família, qual lado nosso está evidente: o iluminado ou o escuro? O que vaza através de nossa alma: luz ou trevas? Quem somos de fato: seres performáticos ou andarilhos nus? Commodity de gente, ou humanos singulares?

A pergunta é simplista, mas tem seus porquês... É que no mundo pós-moderno fomos obrigados a viver baseados na “cultura da imagem” a qual, alterando nossos valores, fez-nos existir na perspectiva da “sociedade da aparência”. Desprovidos de conteúdos, nos revestimos de opulência ótica para camuflar nossa miséria ética. Parecer é nosso sonho de consumo! Ser, a agonia-nossa-de-cada-dia.

Deus ama a luz, pois tudo o que é luz traduz-se em vida. Por isso Jesus disse que a nossa luz deveria brilhar em meio aos homens. A afirmação, contudo, está para além de nossa hermenêutica simplória. É que luz, em nossos conceitos, está associada apenas a coisas boas, ações meritocráticas – dar esmola a velhinhos, visitar pessoas enfermas, ir a velórios, e até algumas tidas como “espirituais”, como dar o “dízimo”.

Luz, na perspectiva de Jesus, é tudo aquilo que irradia verdade e vida. Tanto boas obras, tiradas do tesouro do coração, que pela via da reconciliação foi pacificado, como também medos, dores, angústias e contradições. Todas estas matizes, ao vir à luz, revelam em nós o que em nós é verdade e, por assim ser, aniquilam a possibilidade de virmos a nos constituir estelionato existencial.

É assim que pulsões, taras, síndromes, ódios e todas as sombras incrustadas em nossos labirintos profundos se desgrudam de nós, pois tudo o que não produzir saúde e paz acabará sendo expurgado pela luz. Alegoricamente, seria como abrir as janelas de um velho porão para que os raios de sol pudessem entrar. Luz, que tudo revela, lançada sobre a alma, dissipa toda escuridão. Só assim os “ambientes interiores” podem, novamente, reencontrar a paz e a alegria de existir.

Por isso, creia-me, o pior tipo de falsificação sócio-existencial é aquela que tenta produzir luz artificial, e isto com vistas a camuflar a imensa escuridão que há em nós. A sedução para produzir esse tipo de “luz” nos projetará apenas como hologramas caricaturados, e, por fim, acabará nos levando a não reconhecer o que, de fato, somos: “metamorfose ambulante”.

Conclusão

O que eu aprendi com a parábola do Publicano e do Fariseu é que Deus é capaz de ver o lado escuro das pessoas, mas, ainda assim, continua amando-as profundamente. Para Ele, toda escuridão desaguada sobre a luz acaba transformando-se em vida, pois inicia no ser o processo de construção de uma nova consciência, uma “reinvenção” de nós mesmos, de dentro para fora, e isso, no desdobrar da vida, produz uma espiritualidade saudável e uma existência sustentável.

Syd Barrett tinha razão, pois qualquer um pode ver o lado claro da lua. Qualquer um pode ver o que é aparente, opulente ou reluzente. Isso, todavia, tratado da perspectiva dos seres humanos, pode revelar que, não raro, aquilo que parecia ser luz, é trevas, e, aquilo que parecia ser trevas, sendo ressignificado, pode transformar-se em luz.

É certo que Deus sabe que nossa matéria é feita de contradições e nosso coração de ambigüidades. No fundo, somos substância composta de bem e mal, ternura e tormento, sombras e silêncio. Um dia, todavia, seremos como Ele é...

Mas, para o hoje, para o agora, a proposta é vivermos na luz! Viver a vida que tem que ser existencializada na integralidade do que somos. Se for assim, parafraseando Nietzsche, nunca nos renderemos à encenação, como se estivéssemos num baile de máscaras. No palco da nossa vida, os holofotes jamais produzirão dissimulações, pois, como atores desta grande “peça”, nos comprometemos a representar apenas aquilo que, de fato, revela o que o ser é.

Por isso, fuja de toda a possibilidade de se tornar um personagem num teatro de marionetes, pois, saiba, seu significado existencial é ser “barro encarnado”, sangue e suor, mas seu destino eterno é, ressignificada sua consciência, passar de existente a gente, transmutar-se do não ser ao ser de fato.

E não se esqueça: você foi convidado a sentar à mesa, apreciar o cardápio e degustar tudo o que lhe vier como vida, e isso com coração agradecido. Não se furte a nada, pois luz e trevas lhe sobrevirão, dias de sol e de escuridade, mas, com toda certeza “tudo valerá a pena se a alma não for pequena”. E quem entender diferente disto, penso eu, ainda não compreendeu o porquê de Deus gerar seres humanos sobre a Terra.

S o l a   G r a t i a !

6 comentários:

  1. Barbosa3:39 PM

    Irmão HERMES,a Graça e a Paz somente em Jesus Cristo.
    Meu irmão,o povo escolhido e sincero que fala de Jesus Cristo,e da sua salvação de vida eterna,muito em breve,irá começar a perseguição a nos cristãos,e não demora não! Isto será à nova ordem mundial.
    Começaram ter novas leis entre elas a de amordaçar a boca do Verdadeiro cristão,o que serve e segui realmente a Jesus.
    Aproveite irmão HERMES o máximo este instrumento que está em tua mão a internet.
    Pregue,e fale sem parar,que só Jesus Cristo Salva,Liberta,Cura,e é o único caminho que leva o homem o pecador ao céu,e dá à vida eterna.
    Gostaria de falar sobre esta última estrofe do texto,porque DEUS gerou seres humanos e também do Fariseu e o Publicano. É a minha opinião OK?
    Sobre a geração do homem e mulher. No livro de Gêneses 1.26 diz: E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem,conforme a nossa semelhança.
    Esta expressão contém uma referência primeva ao DEUS TRINO E UNO. Ao uso da primeira pessoa do plural("nós,oculto) indica que há pluralidade em DEUS ver Salmos 2.7; Isáias 48.16. A revelação da característica Trina e Una de DEUS só se torna clara,porém,quando chegarmos ao Novo Testamento ver Mateus 3.17; Marcos 1.11.
    Tanto o homem quanto a mulher foi uma criação especial de DEUS,não um produto da evolução ver
    Gêneses 1.27; Mateus 19.4; Marcos 10.6. O homem e a mulher,igualmente,foram criados à "imagem" e "semmelhança" de DEUS. à base dessa imagem,o homem e a mulher podiam comunicar-se com DEUS,ter comunhão com Ele e expressar de modo imcomparável o seu amor,glória e santidade. DEUS projetou o ser humano como em ser trino e uno(corpo,alma e espírito),que possui mente,emoção e vontade,para que possa comunicar-se espontaneamente com Ele como SENHOR,adorá-lo e servi-lo com fé,lealdade e gratidão. DEUS deixou de tal maneira esse relacionamento com a raça humana que,quando Satanás conseguiu tentar Adão e Eva a ponto de ser rebelarem contra DEUS e desobedecer ao seu mandamento,Ele prometeu enviar um Salvador que é Jesus Cristo para redimir a humanidade das conseguências do pecado ver Gêneses 3.15.
    Agora o porque DEUS fez o homem e a mulher,isto é um mistério de DEUS,Ele é o criador de tudo,e tudo tem o seu propósito; DEUS é o Grande Eu Sou.
    O FARISEU E O REPUBLICANO. Em Lucas 18.9-14 que diz: E disse também esta parábola a uns que confiavam em si mesmos,crendo que eram justos,e desprezavam os outros.
    Digo-vos que este desceu justificado para sua casa,e não aquele;porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado,e qualquer que a si mesmo se humilhar será exaltado.
    O FARISEU,era justo aos seu próprios olhos. A pessoa que pensa ser justa por causa dos seus próprios esforços não tem consciência da sua própria natureza pecaminosa,da sua indignidade e da sua permanente necessidade da ajuda,misericórdia e graça de DEUS. Por causa dos seus destacados atos de compaixão e da sua bondade exterior,tal pessoa acha que não precisa da graça de DEUS.
    O REPUBLICANO,por outro lado,estava profundamente consciente do seu pecado e culpa e,verdadeiramente arrependido,voltou-se do pecado para DEUS,suplicando perdão e misericórdia. Tipifica o Verdadeiro Filho de DEUS JESUS CRISTO DE NAZARÉ.

    ResponderExcluir
  2. Wendel Bernardes4:31 PM

    Olá querido Hermes...
    embora o chamado "lado escuro" não seja necessariamante um fato pra alguns , pelo menos é uma 'teoria' a ser considerada.
    Hoje mesmo me deparei com um 'comment' num outro blog que sigo, falando da opinião de um famoso humorista em seguir seu caminho sem acreditar em Deus e em seu amor.
    As vezes não há lado escuro... ás vezes há escuridão total mesmo!

    Quem sabe o Pink Floyd não queira gravar o "The Dark Heart of The Humam", (agora com o David Gilmour, claro... srrsrs)
    Ah, parabéns pelo novo visual...
    Grande abraço!
    ---------------
    Visite nosso blog:
    http://wendelbernardes.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  3. Hermes, Paz!
    Muito bom o texto!
    A religiosidade possui com método camuflar e esconder nosso lado escuro .
    Jesus, ao contrário, nos chama a entregar este fardo a Ele.

    Estranho como algumas coisas caminham...

    Abs,
    Vinicius Morais
    -----
    Visite: Refletindo a Graça
    Conheça nosso podcast
    http://refletindoagraca.blogspot.com

    ResponderExcluir
  4. exato, belo, esplêndido!!!

    ResponderExcluir
  5. Muito bom seu blog, Hermes... Ja postei seu banner em nossa area de parcerias http://www.seligafamilia.com.br/p/blogosfera.html

    Se puder, publique nosso banner em seu blog para fecharmos a parceria.
    Um abraço e obrigado pelo apoio!

    Ricardo Lebedenco

    ResponderExcluir
  6. Parceria feita!

    Vai ser uma satisfação caminharmos juntos.

    Obrigado a todos pelos comentários sempre abençoadores.

    ResponderExcluir