Por Hermes C. Fernandes
“No princípio criou Deus os céus e a terra. A terra era sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas.” Gênesis 1:1-2
Eis a prova de que o Criador prima pelo processo! Em vez de fazer todas as coisas já devidamente prontas, ele prefere submetê-las ao processo de acabamento. Alguns intérpretes afirmam que na verdade a terra tornou-se sem forma e vazia, e chegam a conjecturar que o evento que deflagrou este caos foi a queda de Satanás. Todavia, se lermos o texto sem tentar encaixá-lo em nossa teologia, veremos que ele diz exatamente o que o autor pretendia dizer: Deus cria os céus e a terra, porém, a terra ainda era informe e desabitada. A partir deste ponto do poema da criação, o autor nos brinda com várias estrofes em que Deus vai aperfeiçoando Sua obra, passo a passo até poder soltar um sonoro "Muito bom!"
A criação da Terra serve de analogia para a criação do novo homem em Cristo. Nós somos a nova terra. Tanto a terra quanto o céu, emergiram do nada (ex niilo). Entretanto, a obra não estaria completa, enquanto se mantivesse “sem forma e vazia”.
“Pois assim diz o Senhor que criou os céus, ele é Deus; foi ele que formou a terra, e a fez, ele a estabeleceu; ele não a criou para ser vazia, mas a formou para que fosse habitada...” Isaías 45:18A primeira providência de Deus para mudar situação caótica temporária em que sua obra se encontrava foi criar a luz: “E disse Deus: Haja luz. E houve luz” (v.3). Sem a luz, a forma não seria distinguível, senão de maneira precária pelo tato. No dizer de Paulo,“todas as coisas manifestas pela luz tornam-se visíveis, pois é a luz que a tudo manifesta” (Ef. 5:13).
A luz representa o entendimento, a revelação da Palavra, da vontade de Deus. Enquanto a luz visa dar forma, o Espírito Santo, ao pairar sobre a face das águas, tinha por objetivo “encher” o que estava vazio.
A terra deveria ser o cenário onde os propósitos de Deus se realizariam. O Novo Homem, recriado em Cristo, surge em um instante. A conversão não é gradual, como sustentam alguns. Ela acontece no momento em que a Palavra de Deus é ouvida, recebida e crida. Entretanto, a nova criatura agora precisa receber “forma” e “conteúdo”. Ela ainda é uma massa informe, tal qual uma criança que acaba de ser concebida. Aos poucos, à medida que ela recebe luz, conhecimento daquilo que é agradável a Deus, através da Palavra, ela vai adquirindo forma. Como diz a Escritura:
“Pois outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor. Andai como filhos da luz (pois o fruto da luz consiste em toda a bondade, e justiça e verdade), descobrindo o que é agradável ao Senhor.” Efésios 5:8-10
Ela já não pode “conformar-se com o mundo” (Rm.12:2). Mas deve renovar-se no conhecimento para que experimente qual seja a boa, perfeita e agradável vontade de Deus. Ela é, por assim dizer, remodelada, adquirindo uma nova imagem.
Quando falamos em “forma”, estamos nos referindo à imagem, isto é, àquilo que se vê. Deus fez o homem à Sua imagem e semelhança, conforme vemos em Gênesis. Enquanto a imagem diz respeito à forma, a semelhança diz respeito ao conteúdo. Ao cair, o homem teve a sua imagem espiritual descaracterizada, borrada pelo pecado. E como se não bastasse, Adão transmitiu isso a todas as gerações. Vejamos:
“Adão viveu cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem, e pôs-lhe o nome de Sete." Gênesis 5:3Paulo dá testemunho disso, ao afirmar:
“O primeiro homem (Adão), sendo da terra, é terreno, o segundo homem (Jesus) é do céu. Qual o terreno, tais são também os terrenos; e qual o celestial, tais também os celestiais. E, assim como trouxemos a IMAGEM do terreno, assim traremos também a imagem do celestial.” 1 Coríntios 15:47-49
Herdamos as características de nossos progenitores. Trazemos a imagem daqueles que nos geraram. E todos pertencemos à mesma árvore: Adão. Por isso é necessário ao homem nascer de novo, para que herde as características do novo Adão, Jesus Cristo, e assim, possa habitar o novo céu e a nova terra criados por Deus. Mais adiante falaremos sobre a realidade do novo céu e da nova terra.
Quando falamos de “forma”, estamos falando de “padrão”, daquilo que é visível. Jesus, porém, veio reconciliar com Deus as coisas visíveis e invisíveis (Col.1:15). Há algo que não pode ser visto, pois trata-se da essência, do homem interior, do conteúdo. Lembremo-nos que, como vasos de barro, somos apenas recipientes de um valioso tesouro (2 Co.4:7). Aquilo que se vê tem importância, pois dá testemunho daquilo que não se vê. Entretanto, a essência precede a forma. Se ficarmos estacionados nessa questão, corremos o risco de viver uma religiosidade de fachada, ao estilo dos fariseus contemporâneos de Jesus. Cabe aqui a exortação de Paulo aos judeus:
“Mas tu que tens por sobrenome judeu, e repousas na lei, e te glorias em Deus; e conheces a sua vontade e aprovas as coisas excelentes, sendo instruído na lei; e confias que és guia dos cegos, LUZ DOS QUE ESTÃO EM TREVAS, instruidor dos néscios, mestre de crianças, que tens a FORMA da ciência e da verdade da lei; tu, pois, que ensinas a outro, e não te ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas? Tu, que dizes que não se deve adulterar, adulteras? (...) Tu, que te glorias na lei, desonras a Deus pela transgressão da lei? (...) Não é judeu o que o é exteriormente, nem é circuncisão a que o é exteriormente na carne. Mas é judeu o que o é no interior, e circuncisão a que é do coração, no espírito, não na letra, e cujo louvor não provêm dos homens, mas de Deus.” Romanos 2:17-22a, 23, 28-29
Eles tinham a forma. Eles tinham a Lei. Mas faltava-lhes a Graça, o conteúdo. Para eles, era como se a terra já não estivesse sem forma, mas continuava vazia. Havia luz, mas o Espírito não pairava sobre a face das águas!
Embora a Lei conferisse “forma”, apontasse um padrão de comportamento para o homem caído, o escritor sagrado garante que ela “não tem a imagem exata das coisas” (Hb.10:1). Por isso, ela era incapaz de devolver ao homem a Imago Dei perdida na Queda. Era necessário 'Algo' que fosse a “imagem exata”, e não apenas uma mera “fotocópia”. Na verdade, não era de “algo” que o homem precisava, mas de “Alguém”. Hebreus 1:3 nos revela esse Alguém que é “o resplendor da sua glória e a expressa imagem da sua pessoa”.
Jesus “encarnou” a Lei, e foi capaz de transcendê-la. Ele não apenas a cumpriu, mas foi além de suas demandas. Por isso Ele mesmo disse:
“Não penseis que vim destruir a lei ou os profetas; não vim para destruí-los, mas para cumpri-los (...) Pois vos digo que se a vossa justiça não EXCEDER a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus.” Mateus 5:17,20
O verbo “cumprir” também pode ser traduzido por “encher”. A Lei apresentou-nos a “forma”, porém homem algum foi capaz de preenchê-la. Somente Jesus a preencheu, e desafiou Seus discípulos a excederem a justiça alcançadas pelos homens mais religiosos da época. Exceder é ir além.
Jesus, portanto, nos oferece um novo modelo. Ele é exatamente aquilo que Deus espera que sejamos. E “aquele que diz que está nele, também deve andar como ele andou” (1 Jo. 2:6). Portanto, Jesus nos oferece a forma e o conteúdo. Ele nos devolve a imagem e a semelhança de Deus. A forma diz respeito àquilo que fazemos, o conteúdo diz respeito àquilo que somos.
A grande missão de Cristo é reconduzir o homem a Deus. Mas para que isso seja possível, é necessário que lhe seja restituído a imagem e a semelhança divinas, das quais foi privado a partir da Queda.
Paulo afirma que Deus nos predestinou para sermos “conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm.8:29). Nosso destino é alcançarmos a perfeição (forma, imagem) e a plenitude (conteúdo, semelhança). Proponho que investiguemos de quê maneira se opera em nós o “remodelamento” e o “enchimento”.
Como somos remodelados?
Para que haja forma, é necessário que haja luz. Paulo diz que Satanás, chamado ali de “deus deste século”, “cegou os entendimentos dos incrédulos, para que não lhes resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a IMAGEM DE DEUS” (2 Co.4:4). São esses incrédulos para os quais “o nosso evangelho ainda está encoberto” (v.3).
É necessário que haja uma revelação provocada pelo Espírito Santo, para que possamos contemplar a glória de Cristo, que é a imagem do Pai. Paulo diz que “quando um deles se converte ao Senhor então o véu é-lhe retirado” (3:16) E assim, “todos nós, com o rosto descoberto, refletindo a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na MESMA IMAGEM, como pelo Espírito do Senhor” (v.18).
Aos poucos, o Espírito Santo vai transformando nosso modo de viver, e nos fazendo semelhantes a Cristo, a imagem exata do Pai. Na medida em que nos renovamos no espírito do nosso entendimento, somos revestidos do novo homem, “que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade” (Ef.4:24). De acordo com Paulo, é esse “novo homem” “que se renova para o conhecimento, segundo a IMAGEM DAQUELE QUE O CRIOU” (Col.3:10). Agora Cristo não é apenas o Unigênito de Deus, mas o Primogênito. “Por esta causa Jesus não se envergonha de lhes chamar irmãos” (Hb.2:11).
A remodelagem feita pelo Espírito em nós é gradual. É chamada de santificação. Para que fôssemos “refeitos”, e nos tornássemos novamente a “imagem” de Deus, Cristo teve que assumir a nossa própria imagem. Assim como nos tornamos “imagem” de Deus, sem nos tornarmos Deus, Cristo tornou-Se imagem do pecado, sem tornar-Se pecador. Paulo diz que devido à inabilidade da Lei em nos tornar santos, Deus enviou “o seu Filho em semelhança da carne do pecado” (Rm.8:3). E em outra passagem diz: “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co.5:21). Esse era o preço que Cristo deveria pagar para que nos fosse restituída a imagem de Deus.
A obra não seria completa se fôssemos remodelados, mas não fôssemos igualmente cheios. Além de alcançarmos a perfeição (forma), fomos destinados a alcançar a plenitude (conteúdo). Se a forma diz respeito àquilo que se vê, o conteúdo diz respeito àquilo que não se vê. Ao agirmos como Cristo agiria, estamos demonstrando que recobramos a imagem de Deus. Entretanto, não nos basta agir como Cristo, devemos SER como Cristo. Devemos almejar nos assemelharmos a Ele. Não se trata aqui do mesmo desejo que Satanás teve. A diferença é que Satanás quis alcançar a semelhança de Deus, a fim de sobrepujá-Lo. Longe de nós tal pensamento! Jamais desejaríamos ser maiores do que nosso Pai. Jesus disse:
“O discípulo não é mais do que o mestre, nem o servo mais do que o seu senhor. Basta ao discípulo ser como seu mestre, e ao servo como seu senhor.” Mateus 10:24-25
Esse é o nosso destino final: “Quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque assim com é, o veremos” (1 Jo.3:2). Embora essa promessa vá cumprir-se plenamente na Vinda de Cristo, devemos crer que ela já começa a cumprir-se hoje. Afinal, o mesmo João diz: “Qual ele é, somos nós também neste mundo” (4:17b).
A imagem aponta para as obras, para a Justiça. A semelhança fala da essência. A justiça divina diz respeito à maneira como Deus age. Porém, quando falamos da essência, estamos nos referindo àquilo que Deus é. E qual é a melhor definição que já se fez de Deus? O mesmo apóstolo é quem nos dá essa definição: “DEUS É AMOR” (1 Jo.4:8b). Deus faz justiça, mas é amor. “Quem está em amor está em Deus, e Deus nele” (v.16b).
Ser cheio de Deus é, portanto, ser cheio do AMOR.
Mas não deveríamos ser cheios do Espírito Santo, conforme orienta Paulo em Efésios 5:18? Mas o que é ser cheio do Espírito, afinal? Paulo responde:
“...O amor de Deus está derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.” Romanos 5:5bO amor é o primeiro gomo do fruto do Espírito (Gl.5:22). O cumprimento da lei é o amor (Rm.13:10b). Ou em outras palavras, o “enchimento”, o conteúdo da lei é o amor. Sem ele, pode até haver forma, mas não há conteúdo.
Todos apreciam a promessa que garante que aquele que crê no Senhor fará as mesmas obras que Ele, e as fará maiores ainda, porque Ele estará junto ao Pai para garanti-las (Jo.14:12). Mas se a proposta do evangelho se restringisse a isso, ele não seria completo. Conforme diz Paulo, “ainda que eu tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria” (1 Co.13:2). O mais importante não é o que se faz, mas o que se é. Não adianta fazer, sem ser. Que façamos as mesmas obras que Ele! Mas que, além disso, haja em nós “o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus” (Fp.2:5). E que sentimento foi esse? O Amor.
Para que nos tornássemos novamente a imagem e semelhança de Deus, o amor fez com que Cristo, “sendo em forma de Deus”, não tivesse por usurpação “ser igual a Deus, mas a si mesmo se esvaziou, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens. E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz” (vv.6-8). Eis aqui a única maneira para que sejamos “cheios” de toda a plenitude de Deus.
O caminho do pleroma é o kenoma. Cristo teve que experimentar um “esvaziamento” (grego=kenoma), para que pudéssemos ser cheios de Deus. Ele esvaziou-se de Suas prerrogativas divinas, mas não Se esvaziou do Seu amor. Ele foi capaz de Se fazer “servo” (lit.: escravo). Provavelmente, Paulo estava se referindo ao episódio narrado em João 13. Ali diz que “sabendo Jesus que a sua hora de passar deste mundo para o Pai já tinha chegado, como havia amado os seus, que estavam no mundo, AMOU-OS ATÉ O FIM” (v.1). Afinal, o amor jamais acaba (1 Co.13). Quem ama, ama até o fim. Diante do olhar curioso dos Seus discípulos, Jesus desnudou-Se, cobriu-Se com uma toalha, e começou a lavar os seus pés. Ninguém entendeu nada. Aquela era uma tarefa dada aos escravos. Eram eles que vinham com bacias cheias de água, para refrescar os pés dos visitantes da casa. Vendo que Pedro estava confuso com o que assistia, Jesus disse: “O que eu faço não sabes agora, mas o compreenderás depois” (v.7). Foi pela pena de Paulo, que Deus nos fez entender o que Jesus estava fazendo. Era necessário que Ele experimentasse uma kenósis completa. Ele tinha que descer ao mais baixo nível, humilhando-Se a Si mesmo, para que agora, movidos pelo mesmo amor, pudéssemos ser cheios da Plenitude de Deus. Foi o mesmo João que registrou essa cena que disse:
“Da sua plenitude todos nós recebemos graça sobre graça. Pois a lei foi dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo.” João 1:16-17
Agora temos mais do que a forma da Lei, temos o conteúdo da Graça: o amor. Através de Sua oferta de amor, tornamo-nos perfeitos, alcançamos a justiça exigida pela Lei (Hb.10:14). Porém, a Sua cruz fez mais do que nos conferir a perfeição exigida na Lei. “Pois o amor de Cristo nos constrange”, diz Paulo, “julgando nós isto: um morreu por todos, logo todos morreram. E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si, mas para aquele que por eles morreu e ressurgiu” (2 co.5:14-15).
Agora não temos apenas uma razão para obedecermos a Deus, mas também uma motivação. A razão é a justiça divina, a motivação é o Seu amor. Somos constrangidos por esse tão grande amor. Somos batizados nesse amor. Fomos invadidos e tomados por esse amor. Precisamos experimentar essa Kenósis (esvaziar), se quisermos experimentar o Pleroma de Deus. Temos que nos esvaziar de nós mesmos, para sermos tomados por Deus.
Esta Obra que opera nos remidos não para. Mãos peritas, invisíveis e insondáveis trabalham sobre o Tempo kairosférico moldado cada detalhe necessário aos Soldados Remidos.
ResponderExcluirA Obra, neste horizonte físico, planeta, só termina no dia da sublimação.
Esta Obra que opera nos remidos não para. Mãos peritas, invisíveis e insondáveis trabalham sobre o Tempo kairosférico moldado cada detalhe necessário aos Soldados Remidos.
ResponderExcluirA Obra, neste horizonte físico, planeta, só termina no dia da sublimação.
PAIXÃO, Edson.
Esta Obra que opera nos remidos não para. Mãos peritas, invisíveis e insondáveis trabalham sob o Tempo kairosférico moldando cada detalhe necessário aos Soldados Remidos.
ResponderExcluirA Obra, neste horizonte físico, planeta, só termina no dia da sublimação.
PAIXÃO, Edson.