Hermes C. Fernandes
Havia uma expectativa no ar. Todos comentavam entre si que finalmente chegara
o dia em que o Messias tão esperado adentraria triunfantemente em Jerusalém;
dirigindo-se ao palácio, deporia Herodes, o rei fajuto, marionete do império
romano. Um tal galileu surgira na periferia, fazendo milagres, exorcizando
demônios, alimentando multidões. Além de tudo, tinha pedigree. Só poderia ser
Ele, o filho de Davi, que libertaria Seu povo do domínio romano, e assumiria o
trono do qual era herdeiro.
A cidade estava em polvorosa. Munidos de ramos, todos dirigiram-se ao portão
principal para dar boas vindas ao que vinha em nome do Senhor. HOSANA! Os tempos
áureos voltaram! Viva o Filho de Davi!
De repente, desponta no horizonte um figura doce, serena, montada num
jumentinho. Seus discípulos O precediam e engrossavam os brados de hosana.
Acostumados em assistir às paradas triunfais, em que reis e generais se
apresentavam montados em extravagantes corcéis, a imagem d’Aquele galileu
montado num jumento era, no mínimo, frustrante. Mesmo sem entender direito o
que acontecia, os brados de hosana se intensificavam. Talvez aquilo fosse um
recurso cênico, visando identificá-lO com as camadas mais pobres e oprimidas da
sociedade. Ninguém podia supor que o jumentinho era emprestado.
Ao atravessar o portão da cidade, todos imaginavam que Ele Se dirigiria ao
palácio, liderando o povo para um golpe de estado, mas em vez disso, Ele toma o
lado oposto, e Se dirige ao Templo.
Possivelmente muitos pensaram que Ele faria uma breve escala no templo, a fim
de legitimar Seu motim, buscando apoio da casta sacerdotal.
Inusitadamente, Sua feição é transformada. O galileu humilde montado num
burrinho, agora improvisa um chicote, adentra os pátios do templo, e de lá
expulsa os cambistas e mercadores.
Confusão geral! Os brados de hosana foram substituídos por burburinhos. Todos
estavam enganados em suas expectativas. Ele não estava interessado em ser
unanimidade. Não buscava apoio dos sacerdotes, nem dos dos principais partidos
religiosos.
O reino que Ele representava não propunha mudanças que começassem pelo
palácio, mas pelo templo. A Casa de Seu Pai estava sendo profanada, transformada
num mercadão a céu aberto. Antes de instaurar a ordem do reino, aquela “ordem”
teria que ser subvertida. Mesas de pernas pro ar! Gaiolas abertas! Cambistas
expulsos!
O mesmo Cristo do jumentinho é o Cristo do chicote. Não confunda Sua
humildade com passividade. Ele jamais fez vista grossa às injustiças dos homens.
Depois de limpar o terreno, cegos e coxos Lhes são trazidos, e Ele os cura
ali mesmo. De repente, o silêncio é quebrado por brados de hosana, que desta vez
vinham dos lábios de crianças.
Os sacerdotes, indignados, perguntam se Ele não se incomoda com aquilo. Jesus
responde: Vocês jamais leram? Da boca das crianças é que sai o mais puro louvor.
Repare nisso: Os hosanas bradados à entrada de Jerusalém não mereceram
qualquer comentário de Jesus. Entretanto, Ele sai em defesa das crianças que O
louvavam com a mesma expressão. Por quê? Porque estes eram legítimos,
desprovidos de interesses. Os hosanas de quem O recepcionou à porta da cidade
foram interrompidos, tão logo Jesus feriu seus interesses. Os mesmos lábios que O enalteciam, dias depois clamavam por sua crucificação. Quão volúveis somos nós, humanos. Num dia aplaudimos, noutro vaiamos. Quem hoje é unanimidade, amanhã é execrado.
Aqueles O louvavam por imaginarem que Jesus planejava um golpe político, e
que, em posse do trono, romperia relações com Roma, reduziria a carga
tributária, e restabeleceria a monarquia de Davi. Mas Jesus tinha em mente outro
tipo de revolução. Somente as crianças estavam prontas para isso. Naquele
momento, Jesus Se tornou no super-herói da meninada.
Só Ele teve a coragem de desafiar o status quo. Só Ele ousou enfrentar os que detinham o monopólio religioso.
Só Ele teve a coragem de desafiar o status quo. Só Ele ousou enfrentar os que detinham o monopólio religioso.
Enquanto as crianças O louvavam, os adultos, indignados, já pensavam em como
detê-lO. Foi esta postura subversiva que Lhe custou a vida. Começava ali a
contagem regressiva para que o Cristo subversivo fosse morto, não por defender
uma ideologia, mas um ideal, o ideal do Reino de Deus.
Desde então, o grito de “hosana” deveria ter conotação subversiva, e não ser
mais um jargão religioso. Que seja o hosana das crianças, dos representantes do
futuro, aqueles para os quais é o reino dos céus, e não o hosana dos interesses inconfessáveis,
do monopólio, da religiosidade insípida, do jogo político. É triste e revoltante ver tantos
cristãos deixando seus cultos dominicais portando ramos nas mãos, sem com isso
serem cúmplices de Deus na instauração do Seu reino.
Que a religião instituída desista de tentar domesticar Jesus. Que ninguém se atreva a reduzir Sua agenda às nossas expectativas e paixões ideológicas.
Aos líderes evangélicos que fazem coro com o que há de mais reacionário no atual cenário brasileiro, antes de saírem às ruas, promovendo seus 'atos proféticos' para amarrar o principado da corrupção, com seus comícios travestidos de cruzadas evangelísticas, preparem-se para receber uma visita relâmpago de Jesus em suas próprias igrejas. Assim como os cambistas transformaram o pátio do templo num mercadão a céu aberto, muitos estão transformando a igreja em curral eleitoral. O Cristo que derruba mesas, também derruba púlpitos. Então, antes de apontar seus dedos inquisidores para os de fora, tratem de parar de negociar os votos de suas ovelhas ou induzi-las com seu discurso de ódio a se posicionarem contra outros segmentos. Lembrem-se de que o juízo de Deus sempre começa pela Sua própria casa, e ele será sem misericórdia com os que não usaram de misericórdia com os seus semelhantes.
Aos líderes evangélicos que fazem coro com o que há de mais reacionário no atual cenário brasileiro, antes de saírem às ruas, promovendo seus 'atos proféticos' para amarrar o principado da corrupção, com seus comícios travestidos de cruzadas evangelísticas, preparem-se para receber uma visita relâmpago de Jesus em suas próprias igrejas. Assim como os cambistas transformaram o pátio do templo num mercadão a céu aberto, muitos estão transformando a igreja em curral eleitoral. O Cristo que derruba mesas, também derruba púlpitos. Então, antes de apontar seus dedos inquisidores para os de fora, tratem de parar de negociar os votos de suas ovelhas ou induzi-las com seu discurso de ódio a se posicionarem contra outros segmentos. Lembrem-se de que o juízo de Deus sempre começa pela Sua própria casa, e ele será sem misericórdia com os que não usaram de misericórdia com os seus semelhantes.