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sábado, agosto 20, 2016

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É legítimo usar a dança como expressão de louvor a Deus?




Por Hermes C. Fernandes

Não é de hoje que a dança é um tabu entre os cristãos de diversas tradições. Há quem a admita apenas como expressão cultural ou de interação social, mas jamais como instrumento de louvor a Deus. E há quem faça o caminho inverso, usando e abusando da dança no ambiente de culto, porém, desprezando-a fora dali.

Pesquisando pela internet encontrei várias advertências quanto ao seu uso pelos cristãos. De acordo com o site Jesus Voltará, a igreja metodista condena a dança, alegando que ela é "prejudicial à vida cristã. O mesmo site afirma que para a igreja congregacional, "a prática da dança por parte dos membros de nossa igreja não condiz com a profissão religiosa, devendo ser tornada objeto de disciplina. A igreja presbiteriana consideraria "a prática de dança por parte dos membros da igreja como pasmosa incoerência", e alerta aos pais que enviarem seus filhos a escolas de dança de estarem cometendo um grave erro na disciplina da família. Para o bispo A. C. Coxe da igreja episcopal, "a dança é lascívia". O mesmo bispo advertiu aos dançadores a não participarem da mesa da comunhão. O bispo Hopkins, também da igreja episcopal, acrescenta: “A dança é responsável pela dissipação de tempo, a condescendência para com a vaidade pessoal e o incitamento prematuro das paixões, e artifício nenhum pode torná-la condizente com o pacto do batismo.” Nem mesmo a igreja católica romana se posicionou favorável à dança. O Concílio Pleno de Baltimore diz:“Consideramos ser nosso dever advertir nosso povo contra os divertimentos que possam facilmente tornar-se para eles ocasião de pecado, contra as modalidades de danças que, como praticadas presentemente, repugnam a todo sentimento de delicadeza e decoro, e se fazem acompanhar dos maiores perigos para a moral.”[1]

Apesar de todos estes posicionamentos contrários à dança, ela nunca esteve tão presente na vida eclesiástica quanto atualmente.  Deixando de lado as opiniões denominacionais, verifiquemos o que dizem as Escrituras acerca desta prática que acompanha a humanidade desde os seus primórdios.

# Dança como expressão de louvor a Deus nas Escrituras

Não faz muito tempo que algumas igrejas resolveram adotar a dança em seus cultos. Porém, no afã de evitar escândalo, principalmente por parte dos mais conservadores, adotou-se a nomenclatura “coreografia” em vez de “dança”.  A princípio, os grupos de coreografia apresentavam perfomances comedidas, com passos e gestos bem sóbrios. 

Com o passar do tempo, alguns grupos aderiram ao mover conhecido como dança profética.  O termo ‘dança’ em conexão com o termo ‘profética’ tornou a prática mais palatável entre os considerados mais espirituais, despindo-a de sua conotação mundana. Segundo os expoentes do movimento, a dança profética teria o objetivo de trazer mensagens à congregação, levando-a a uma adoração mais profunda.  Deste mover, desenvolveu-se a adoração extravagante, em que os participantes expressam seu louvor a Deus com canções e danças improvisadas.

Já entre os pentecostais clássicos surgiu o movimento conhecido como re-te-té, em que as pessoas são tomadas por uma espécie de êxtase, rodopiando ou marchando pelo salão da igreja. Tais manifestações exóticas são consideradas por estes grupos como danças espirituais, embaladas pelo som de pandeiros e corinhos de fogo cujo ritmo e harmonia lembram pontos cantados em terreiros de religiões afro-brasileiras.

Apesar de nossas reservas devido aos abusos cometidos em alguns movimentos, não podemos negar que haja fundamentação bíblica para o uso da dança como expressão de louvor a Deus.

Lemos no relato do Êxodo dos hebreus, que após atravessarem o Mar Vermelho, “Miriã, a profetiza, a irmã de Arão, tomou o tamboril na sua mão, e todas as mulheres saíram atrás dela com tamboris e com danças” (Êx. 15:20).

Alguns poderão alegar que Miriã provavelmente estava sob influência cultural egípcia, e que àquela altura o povo de Israel ainda não havia desenvolvido sua própria maneira de cultuar a Deus.  Entretanto, encontramos outro episódio ocorrido vários séculos depois, quando Israel já estava devidamente estabelecido como nação, e o culto a Deus já havia sido normatizado. Trata-se da passagem em que Davi trouxe de volta a Jerusalém a Arca da Aliança. O texto diz que “Davi, vestindo o colete sacerdotal de linho, foi dançando com todas as suas forças perante o Senhor, enquanto ele e todos os israelitas levavam a arca do Senhor ao som de gritos de alegria e de trombetas” (2 Sm. 6:14-15). Censurado por sua própria esposa que o acusou de querer exibir-se perante suas servas, Davi se justificou: foi perante Senhor que dancei; e perante ele ainda hei de dançar” (2 Sm 6:21). Aos que insistem em associar a dança com irreverência, pergunto: Estaria Mical com a razão? Teria Davi cometido algum excesso? 

Não bastassem esses dois casos, encontramos uma orientação clara no livro dos Salmos, que, diga-se de passagem, foi fartamente usado pela igreja primitiva como base do seu culto a Deus:

“Louvai-o com o tamborim e a dança, louvai-o com instrumentos de cordas e com órgãos. Salmos 150:4

A maioria que discorda do uso da dança como elemento de culto alega não haver no Novo Testamento qualquer orientação acerca disso. Porém, sabemos pelo próprio Paulo, que a igreja deveria usar os Salmos em seu culto a Deus. Confira:

“Falando entre vós em salmos, e hinos, e cânticos espirituais; cantando e salmodiando ao Senhor no vosso coração.” Efésios 5:19

Teria Paulo e os demais apóstolos censurado o Salmo 150 que nos orienta a louvar a Deus com danças? Recuso-me a crer nesta possibilidade. Imagine a cena: todos estão declamando este salmo, quando, de repente, alguns começam a dançar. Paulo, então, interrompe a leitura e diz: “Parem com isso agora mesmo! Que irreverência! Vocês podem ler, mas não praticar!” Ora, isso não me parece razoável.

E o que dizer dos Salmos 87 e 149? Também deveriam ser censurados?

“Com danças e cânticos, dirão: "Em Sião estão as nossas origens!” 
Salmos 87:7

“Louvem eles o seu nome com danças; ofereçam-lhe música com tamborim e harpa.” Salmos 149:3

A exigência neotestamentária é que o culto deve ter ordem e decência (1 Co.14:40). Porém isso, de maneira alguma, exclui expressões corporais, desde que não sejam apelativas e sensuais. Ademais, por que numa aliança caracterizada pela liberdade faltaria um elemento como a dança tão apreciada sob a primeira aliança? Seria, no mínimo, um contrassenso acreditar que os que vivem sob a égide da graça seriam privados de um bem tão comum aos que viveram sob o peso da lei.

Que tem havido abuso quanto ao uso da dança no culto, não me atrevo a discordar. Só não vejo razão para jogar fora o bebê junto com a água suja do banho. Basta que eliminemos os exageros para que encontremos um equilíbrio.

Penso que haja lugar tanto para danças ensaiadas (performáticas) como para danças espontâneas e congregacionais.  Tudo dentro de um padrão descente e devidamente ordenado. Sem chocarrices. Sem histeria. Sem êxtases. Apenas corações tomados da alegria do Espírito, desejosos de expressar sua gratidão a Deus. 

Décadas atrás, a igreja debatia se deveria ou não usar instrumentos musicais em seus cultos. Hoje, esta temática parece estar ultrapassada. Tanto órgãos como guitarras elétricas e baterias são facilmente encontrados em igrejas de praticamente todas as denominações. Acredito que o mesmo se dará com o uso de dança nos cultos. 

Os pregadores podem ficar tranquilos que a dança jamais substituirá a pregação da Palavra, nem os louvores congregacionais. Se porventura isso ocorrer, compete ao ministro chamar a atenção de sua congregação para que reencontre o equilíbrio perdido. 

No próximo post abordaremos a dança como expressão cultural e de interação social. É lícito ao cristão praticar ballet, dança de salão, valsa de debutante, etc?



[1] http://www.jesusvoltara.com.br/atuais/dancar_danca.htm

domingo, novembro 25, 2012

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Ele é puro êxtase! Já experimentou?


Por Hermes C. Fernandes

Não tenho nada contra a maneira como as Escrituras foram organizadas em capítulos e versículos. Mas alguém aí avisa à turma que o texto original não era assim. Tais divisões ajudam na localização e memorização das passagens, mas ao mesmo tempo, acabam nos privando de uma compreensão mais ampla daquilo que o autor pretendia dizer. 

Por exemplo: você já notou que alguns capítulos das espístolas paulinas (de autoria de Paulo) começam com a conjunção "portanto"? Só para relembrar aquela aulinha de português que talvez tenhamos perdido ou simplesmente deletado de nossa mente: A conjunção "portanto" é utilizada para iniciar uma oração que inclui uma conclusão de uma ideia ou raciocínio explicitado na oração anterior.

Sempre que uma oração começa com esta conjunção, temos que considerar o que fora dito antes. Sem seu contexto, a oração perde grande parte de seu significado original.

Permita-me um exemplo extraído dos escritos de Paulo:
"Portanto, rogo-vos, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional." Romanos 12:1
Conquanto conheçamos bem esta passagem, pois tem sido citada fartamente em nossos cultos e devocionais, só compreenderemos a extensão e profundidade do seu sentido se levarmos em conta o seu contexto. Depois de uma vasta explanação sobre a soberania de Deus e Sua inexplicável graça, Paulo se vê tomado por uma êxtase que resulta numa das mais belas composições registradas no Novo Testamento. 
"Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria como da ciência de Deus! Quão insodáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis os seus caminhos! Quem compreendeu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro? Ou quem lhe deu primeiro a ele, para que lhe seja recompensado? Porque dele e por ele e para ele são todas as coisas. Glória, pois, a ele eternamente. Amém." Romanos 11:33-36
Qualquer ortodoxia que não desague neste tipo de doxologia não passa de presunção humana travestida de doutrina cristã. "Ortodoxia" significa "reta doutrina", enquanto que "doxologia" quer dizer louvor. 

A teologia não pode ser vista como uma dissecação do sagrado. Um Deus que se submete a uma autopsia só pode estar morto, como afirmou acidamente Firedrich Nietzsche. Quando falamos de Deus estamos em terreno sagrado, o que requer de nós toda reverência. Jamais esgotaremos o assunto. Dizer-se "doutor em divindade" chega a ser um insulto. O Deus das Escrituras sempre escapa às definições que os homens intentam lhe atribuir. Nenhum estrutura é capaz de contê-lo. As Escrituras afirmam que nem o céu dos céus pode comportá-lo. 

Diante deste mysterium tremendus, calamo-nos ou deixamos escapar um "uau!". Levemos a sério a advertência divina: "Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus!" (Sl.46:10). Estamos falando de algo tão profundo que a mente humana é incapaz de perscrutar. Seus caminhos são imprevisíveis. Sua mente, insondável. Trata-se de um Ser que não pode ser domesticado. Neste sentido, Ele é um Deus selvagem, que age com absoluta soberania, e não deve explicação a ninguém. 

O hino composto pelo apóstolo termina dizendo que todas as coisas são d'Ele, por Ele e para Ele. Isto é: tudo quanto há em todo o Universo é de propriedade exclusiva d'Ele, tem n'Ele sua origem e alvo de sua existência. Ele é a causa e a razão de tudo. A ciência pode tentar responder a certas questões como "o quê", "como", "quando", "onde". Mas ela jamais conseguirá responder as mais importantes de todas as questões: "Por quê?" e "Para quê"?

Como não ficar extasiado diante de tamanha sabedoria? Nossa compreensão acerca das coisas de Deus equivale a uma gota do oceano. Estamos todos no B+A=BA, engatinhando, balbuciando palavras. Nem a eternidade seria suficientemente longa para que lográssemos compreender a mente de Deus.

É diante deste fato monumental que Paulo nos conclama, rogando para que nos apresentemos como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus. O pouco que sabemos somado ao imenso oceano que ignoramos devem impulsionar-nos a adoração. A palavra escolhida por Paulo para representar o culto que devemos prestar a Deus é "sacrifício", que é a junção de duas outras palavras: sacro + ofício. Não é uma atividade qualquer, um hobby, um passatempo. É a razão de nossa existência. Fomos criados para isso. E repare na ênfase dada à qualidade deste "sacro-ofício"que devemos oferecer a Deus. Ele deve ser vivo, santo e agradável. Vivo porque todas as coisas são d'Ele. Ele é a fonte primeva de toda a vida. Deve ser santo porque todas as coisas existem por Ele. Não há santidade em nós mesmos. Ser santo é viver por Ele, é ser canal através do qual Sua vida flui no mundo. E finalmente, nosso sacrifício deve ser agradável porque vivemos para Ele. Pecado é viver para si. Desde que nos convertemos, tomamos a contramão do mundo. Deixamos de viver para nós, para viver para Ele. O importante não é a nossa satisfação pessoal, mas agradá-lo em tudo.

O culto que oferecemos não é apenas emocional, mas, sobretudo, racional. Isto é, envolve inteiramente a nossa razão. Antes de sermos convertidos, somos convencidos pelo Espírito Santo. Foi Jesus quem disse que o Espírito nos convenceria do pecado, do juízo e da justiça. Ele nos persuadiu. Fomos vencidos por Seus argumentos. Nossa fé, apesar de muitas vezes parecer contrariar à lógica humana, não é irracional. Ela faz sentido. 

Em seguida, Paulo diz:
"E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis a boa, agradável e perfeita vontade de Deus." Romanos 12:2
Já que o nosso Deus vai além de qualquer definição humana, somos convidados a tomá-lo como exemplo, não permitindo que o mundo nos domestique, rotule, defina, ajuste aos seus padrões.

Não conformar-se é não ajustar-se às formas do mundo. Negamo-nos a ser engrenagens deste sistema corrompido. 

Ao conformar-nos, deixamos que o mundo nos rotule. Trata-se de um mecanismo de controle. Quando rotulados, sabemos exatamente o que o mundo espera de nós, e passamos a viver dentro dessas expectativas.  

O reino de Deus tem muito mais a ver com cuidado do que com controle. Deus não precisa nos "controlar" no sentido de uniformizar-nos. Somente um Deus soberano seria capaz de promover o alcance de todos os Seus propósitos sem lançar mão de controlar os Seus agentes. Um Deus soberano não se sente ameaça pela liberdade dos Seus filhos. Ainda que não sejamos livres para arbitrar, somos livres para agir. Esta é a diferença entre livre arbítrio e livre agência. Liberdade implica responsabilidade. Como poderíamos ser responsáveis por nossos atos sem que agíssemos com liberdade?

O mundo tenta nos uniformizar, tornando-nos pessoas previsíveis, estatisticamente controladas. A proposta do Evangelho rompe com qualquer tipo de controle, conferindo-nos a possibilidade de sermos autênticos. 

Nosso culto é legítimo quando é fruto de uma consciência transformada. Um culto mecânico, artificial, é incapaz de agradar a Deus. Robôs não poderiam adorá-lo em espírito e em verdade.

Em vez de nos conformar, somos conclamados a sermos transformados. Ora, transformar é extrapolar as bordas, rebelando-se contra os padrões impostos. Tal transformação não se dá externamente, mas no ambiente do coração. Ainda que reflita no exterior, ela ocorre no íntimo, fora do alcance dos olhos.  Nosso entendimento precisa ser reciclado, renovado. Somente assim experimentaremos a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.

Boa por ser d'Ele, não nossa. Agradável porque é por Ele, não por nós. Perfeita porque é para Ele e não para nós mesmos. 

Quando congregarmos para cultuar a Deus, lembremo-nos de que não estamos ali por nós mesmos. Enquanto O adoramos, nossa plateia é de uma só pessoa. É a Ele que almejamos agradar. Portanto, não O insultemos com um culto mecânico, desprovido de vida, de emoção, de amor. E que nosso culto não termine no último amém, mas prossiga ad infinitum, enchendo todos os nossos dias de alegria e propósito.