Minhas sinceras boas vindas ao Papa

Caro Papa Francisco, paz e bem.

Em nome de minha família e da denominação a que sirvo como bispo, quero dar-lhe boas vindas, e desejar que sua estada na Terra de Santa Cruz seja a mais agradável possível. 

Alegro-me por ver a enorme mobilização da juventude católica em todo mundo para esta jornada. 

É inegável o frescor que o senhor trouxe à igreja católica tão desgastada pelos frequentes escândalos. Espero que sua postura humilde e despojada inspire a muitos outros líderes cristãos ao redor do mundo. Devo confessar minha indignação com a ostentação adotada por alguns que descaradamente torcem as palavras de Jesus para se locupletarem. 

Reconheço que muitas das doutrinas advogadas pelo clero romano destoam daquilo que tão claramente encontramos nas Escrituras Sagradas. Torço para que o senhor possa revisar algumas delas, implementando a tão sonhada reforma pela qual Lutero, monge agostiniano, bravamente lutou.

Admiro a maneira como o senhor tem tratado outras ramificações cristãs, sobretudo, as igrejas protestantes, negando-se a chamá-las de seitas. Creio que este é o caminho que poderá promover a cicatrização de feridas que já sangram por séculos. 

Como ministro protestante, não enxergo sua visita ao Brasil como uma ameaça ao avanço das igrejas evangélicas. Como o senhor já deve saber, muitas dessas igrejas incorrem nos mesmos erros denunciados pelos reformadores. As indulgências cobradas para a construção da Basílica de São Pedro parecem inofensivas diante dos sacrifícios exigidos aos fiéis por parte de algumas delas. De fato, nosso telhado é de vidro. 

Nossos andores carregam santos de carne e osso a quem atribuímos poderes miraculosos. Em vez de Maria e demais santos, fiamo-nos em apóstolos cujo suor é capaz de levantar paralíticos. Trocamos os altares repletos de velas por cópias baratas da Arca da Aliança. As romarias aos santuários por subidas aos montes ou viagens a Jerusalém em busca de elementos consagrados tais como água do rio Jordão, terra do monte Sinai, etc.

Mas nem tudo está perdido! Como o senhor sabe, sempre resta um remanescente formado por aqueles que não se dobram aos modismos doutrinários. Ora, se há um remanescente entre nós, evangélicos, certamente que há entre vós, os católicos. Gente como Madre Teresa de Calcutá, Santo Agostinho, e São Francisco de Assis em quem o senhor parece inspirar-se.

Acredito que dificilmente o senhor lerá esta missiva. Todavia, creio que muitos dos seus seguidores a lerão, e perceberão o respeito que tenho por sua trajetória e pela proposta inovadora do seu pontificado.

Quanto às eventuais manifestações que ocorrerem durante sua visita, saiba que não são dirigidas ao senhor, e sim aos nossos governantes que há muito têm ignorado os anseios populares. Alguns destes que beijarão a sua mão são verdadeiros traidores dos valores cristãos. Homens indignos de sua amizade, pois apunhalam seu próprio povo. Não se deixe iludir por suas palavras bajuladoras. Confronte-os como fez aos governantes de seu país durante o exercício de seu episcopado lá.

Nossas ruas estão sujas de sangue. Nossas autoridades estão vendidas ao capital internacional e aos interesses inconfessáveis. Queira Deus que o senhor seja uma voz profética a denunciá-los diante de todo o mundo. 

A propósito, se o senhor tiver um tempinho, faça uma visita ao Lixão de Jardim Gramacho, onde centenas de famílias vivem dos restos e sobras de nossa sociedade consumista. Caso não possa atender a este convite, apele às nossas autoridades para que gastem ao menos 0,5% do que está sendo gasto na promoção deste importante evento para dar um pouco de dignidade àquela gente sofrida. 

No mais, oro que tudo corra bem durante a Jornada Mundial da Juventude. Que seja o início de uma nova era na história da Igreja Católica. 

Christus Victor! Sempre Invictus! 

+ Hermes C. Fernandes