Se for para votar, vote com amor, não com paixão

Por Hermes C. Fernandes

Parabenizo à minha irmã Marina por sua sábia decisão. Não esperava dela menos do que coerência. Sei que muitos a julgarão. Mas Deus conhece seu coração e motivação. Não vejo Cristo tomando partido nem pelo sinédrio, nem por Herodes, Pilatos ou César. O que muitos chamam de intransigência, chamo de coerência. Espero que ela permaneça comprometida com o futuro e não se venda pelas demandas políticas atuais. 

Como é difícil optar pela isenção quando o assunto é política. Qualquer crítica que façamos a um lado é logo interpretada como apoio velado ao outro lado. Se criticarmos a ambos, mas fazendo maior número de críticas a um deles, também somos postos sob suspeita. As pessoas vociferam: Desce do muro! Posicione-se! Seja claro! Não se acovarde! Será que abster-me é menos digno do que posicionar-me por um deles?

Ao posicionar-me, estarei cerrando fileira com gente da qual discordo em número, gênero e grau, não apenas de seus posicionamentos, mas, sobretudo, de suas motivações. Isso, por si só, já me constrange ao extremo. Olho para ambos os lados e vejo gente que não merece confiança, que está ali somente para se locupletar. O tipo de apoio que uma candidatura atrai revela muito acerca de seus interesses. Não sei o que é pior: ver alguns demônios ao lado de um dos candidatos, ou o inferno inteiro ao lado do outro. Deus nos livre e guarde destes abutres em busca de carniça.

Não me incomodo de ver pessoas assumindo posição, desde que isso não lhes confira o direito de demonizar quem pense diferente e nem lhes prive do senso crítico para enxergar o que há de falho em ambos os lados. Todos têm telhado de vidro. Não vamos demonizar, mas também não vamos canonizar. Se o andor balançar, ambos correm o risco de se espatifar no chão.

Talvez, o que nos falte é que nos posicionemos com consciência e amor, em vez de nos posicionarmos por paixão. O que nos cega não é o amor, mas a paixão. Votar com amor é votar pensando no bem coletivo, principalmente dos mais necessitados, e não no bem próprio ou do seu segmento em particular.

Vamos às razões porque decidi abster-me:

O PT traiu o Brasil! Fez alianças com o que há de mais podre nos quadros reacionários do País. Tudo, segundo eles, em nome da governabilidade. Não bastava a confiança de milhões de brasileiros que os colocaram no poder por doze anos seguidos? Um partido que se vende não merece nossa confiança. Então, alguns raciocinam, já que o PT nos traiu, só nos resta cair no colo do PSDB, certo? O que seria pior, quem se vende, como fez o PT, ou quem vende a nação a preço de banana, como fez o PSDB?

Imagine uma mulher traída que para se vingar do marido adúltero, resolve ter um caso com a amante dele. O PT traiu o Brasil, ponto. E o que faremos? Teremos um caso com a mesma elite com que ele se promiscuiu? Estejam certo disso: o mesmo PMBD que hoje é amasiado com o PT, caso o Aécio se eleja, se amasiará com o PSDB. Vamos trocar seis por meia-dúzia. A sem-vergonhice permanecerá alojada no palácio do planalto, como tem estado há vinte anos.

Ademais, ver revistas rivais apoiando ostensivamente a uma candidatura é, no mínimo, perturbador. Por que será que a grande mídia está fechada com Aécio? O correto seria manter a isenção, limitando-se a transmitir informações. Em vez disso, colocam na capa verdadeiros anúncios pró-Aécio em forma de reportagens. Veja, Isto é, Época, Exame, todas elas (com raríssimas exceções, como é a Carta Capital, que sempre manteve uma posição esquerdista). O nome disso é manipulação. Não importa a quem estejam apoiando.

Houve quem ventilasse que eu estaria apoiando veladamente a eleição de Dilma. Pergunto: O fato de Jesus descer o porrete nos fariseus significava que Ele apoiava os saduceus? O fato de dizer que deveríamos dar a César o que é de César significava que Ele endossava a invasão romana? O fato de hospedar-se na casa de Zaqueu significava que Ele apoiava suas extorsões? O fato de ter curado o escravo de um centurião romano significava que Ele apoiava a escravidão? Infelizmente, não estamos suficientemente maduros para este tipo de posicionamento. 

O PT já tem gente demais para atacar (a grande mídia de um modo geral). Todos já sabemos de suas falcatruas que, diga-se de passagem, são vergonhosas. Já o PSDB posa de bom menino, quando na verdade não o é. Não sou obrigado a me posicionar contra um e favor do outro. Prossigo isento, com liberdade de criticar o que for passível de crítica e, quem sabe, elogiar, quando for digno disso. 

Também não se trata de posicionamento ideológico. Alguém alegou que se for para escolher entre os ladrões, é preferível ficar com o ladrão da direita. Pelo menos, aquele foi salvo. O problema é que o lado direito da cruz de Cristo equivalia ao lado esquerdo de quem assistia à crucificação. Tudo depende do ponto de referência. A esquerda de quem vem é a direita de quem vai. Enquanto discutem se ficam com um ou com outro ladrão, prefiro manter lealdade com a minha consciência e com o que está crucificado no meio de ambos. O Cristo Crucificado representa as vítimas do sistema opressor, das injustiças, da exclusão, do jogo de poder. 

Que tal sermos pela justiça e pela verdade em vez de nos posicionar apaixonadamente por um dos lados? Digo e repito quantas vezes forem necessárias: Nem PT nem PSDB são dignos de que abracemos cegamente suas causas e propostas. Votemos com consciência e amor, mas não com paixão, nem falsas esperanças. Ou então, faça como eu: abstenha-se. Mas faça-o igualmente com consciência, sem paixão.