Grão por grão a vida
escoa na ampulheta
Não há nada que
reverta esta sina
Quem no mundo é
capaz de tal faceta?
Quando o fim a
passos largos se aproxima
Se houver quem se
habilite, me prometa
De pé junto, mão
no peito, mão pra cima
impedir que este gelo se derreta
e o poema vire
prosa, perca a rima
Minhas gírias já
entraram em desuso
Ninguém sabe o que
é broto ou lambreta
Me desculpe se
pareço que abuso
Alguém pode me explicar
o que é treta?
Quantas páginas em
branco no caderno
Mas não tenho
tanta tinta na caneta
Lá se vai o meu outono!
Eis o inverno!
Vou tirar as
minhas meias da gaveta
Quantos sonhos adiei
a vida inteira
Aventuras que
deixei para mais tarde
Já cansei de comer
tudo pela beira
Em meu peito uma
chama ainda arde
Quem sabe, hora
dessas, de veneta
Uma chance vem
bater à minha porta
Do cabide vou
tirar minha jaqueta
Pé na
estrada, fé na vida é o que importa
A guitarra sei que
toco sem palheta
Ver estrelas, não
preciso de luneta
Sem bigode, barba
ou mesmo costeleta
Sou menino, olha
bem minha careta!
Dia desses joguei
fora a chupeta
Falta muito pra
que use uma muleta
Não me venha com este
papo tarja preta
Desta vida quero
mais do que gorjeta
Que ninguém metido
a besta se intrometa
O passado foi
somente aperitivo
Tô cansado de palpites
de xereta
O banquete desta
vida é estar vivo
Pois agora, com os
filhos já crescidos
Eu e ela, como
sempre, inquietos
Pra viver nossos planos
esquecidos
Antes tarde do que
nunca com os netos!
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