Por Hermes C. Fernandes
O coração dos três estava a mil.
Da última vez que foram destacados dos demais, algo extraordinário aconteceu.
- O que será que nos espera desta
vez? Pergunta um deles.
- Haveria glória maior do que
aquela? Pergunta outro.
- Hum... mas Ele andou pedindo ao
Pai que lhe restituísse a glória que tinha antes da fundação do mundo... será
que se trata disso? Como poderemos fitar nossos olhos? Da outra vez já foi tão
difícil... Concluiu Tiago.
- Só não entendi este lance de trazermos espadas... Ele nunca nos pediu para andar armados. Refletiu João.
- Só não entendi este lance de trazermos espadas... Ele nunca nos pediu para andar armados. Refletiu João.
- Bem pensado, João. Mas fale
baixinho pra Ele não ouvir... Espero que
não demore... estou caindo de sono. Sussurrou Pedro.
- Eu também. Disseram em uníssono
Tiago e João, apelidados por Jesus de “filhos do trovão”.
De repente, Jesus interrompe a caminhada,
dirige-se a eles e diz em tom dramático:
- Ok rapazes! Chegamos. Estou profundamente deprimido. Não quis dizer aos outros, porque sei que
ficariam desapontados. Mais do que
nunca, preciso de vocês por perto, me apoiando. Vou um pouco adiante porque
preciso ficar só com o meu Pai. Enquanto isso, fiquem aqui de prontidão em
oração.
Quando Jesus se afastou um pouco,
eles começaram a comentar entre si:
- O que será que Ele está esconde
de nós? Nunca vimos Jesus assim...
O tempo foi passando, as vistas
começaram a pesar e eles adormeceram.
Tocados por Jesus, acordaram
assustados esperando assistir a um espetáculo semelhante ao que assistiram
tempos antes. Mas se decepcionaram. Da vez anterior, estarrecidos com o
espetáculo da transfiguração, mantiveram os olhos arregalados em todo o tempo.
Pedro chegou a sugerir que fossem construídas três tendas para abrigar a Jesus
e os dois profetas que lhes apareceram. Mas desta vez, o sono os vencera. Jesus
os chama e os repreende por estarem dormindo num momento tão crucial de Sua
vida.
- Vocês não podem vigiar e orar
comigo pelo menos por uma hora? Será que não percebem a gravidade da situação?
Preciso que se mantenham de prontidão.
Aparentemente despertos,
sinalizaram como se houvessem entendido o apelo do Mestre. Porém, tão logo
Jesus Se afastara novamente, tombaram dormindo, pois pensavam com os seus
botões: hoje não haverá espetáculo.
Pelo jeito, esses “três
mosqueteiros” às avessas fizeram escola. Dois mil anos passados e ainda somos
tão suscetíveis à cultura do espetáculo ao passo que somos tão indiferentes ao
sofrimento alheio. Apatia crônica é o diagnóstico de nossa espiritualidade. Almejamos
a transfiguração, mas jamais a desfiguração. Queremos Sua divindade, mas não
Sua humanidade. Seu poder, jamais Sua fraqueza. Sua sabedoria, não Sua loucura.
Foi necessário que Deus levantasse um D’Artagnan para chamar a atenção da igreja, despertando-a da letargia (Ef.5:14). Paulo, aquele que sequer se considerava digno de ser chamado “apóstolo” (1 Co.15:8-10), destaca a loucura de Deus como mais sábia que a sabedoria humana, e a fraqueza de Deus acima da força humana (1 Co.1:25).
Foi este quarto mosqueteiro que
enxergou na cruz um espetáculo muito maior que qualquer transfiguração
gloriosa. Mesmo tendo tido a experiência de encontrar Jesus no caminho de
Damasco, cuja glória foi capaz de cegá-lo, Paulo determinou em seu coração a
ninguém anunciar senão a Cristo, e este crucificado (1 Co.2:2). E não apenas isso: ele se achava privilegiado por participar das aflições de Cristo (Cl.1:24). A cruz de Cristo era a sua própria cruz. Enxergá-lo lá era o mesmo que enxergar-se na mesma cruz (Gl.2:20). Não havia do que se envergonhar! A fraqueza de Deus é Sua maior demonstração de poder. A lógica divina subverte a lógica humana. De sorte que os últimos são os primeiros. Quem quiser ser o maior, deve ser o menor. Foi a partir desta lógica subversiva que Paulo concluiu:
"Por isso sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias por amor de Cristo. Porque quando estou fraco então sou forte." 2 Coríntios 12:10
Já ouvi pregadores afirmando que
Cristo não deseja ser visto “nos dias da sua carne”, mas em Seu estado de
glória. Baseiam-se erroneamente numa passagem em que lemos que “a ninguém conhecemos segundo a carne, e, ainda que também tenhamos
conhecido Cristo segundo a carne, contudo agora já não o conhecemos deste modo”
(2 Co.5:16). A questão aqui não é “Cristo nos dias de
Sua carne”, e sim obtermos um conhecimento meramente carnal do mesmo. Pode-se,
inclusive, enxergá-lo em Sua glória, porém, de maneira carnal. Portanto, não se
trata de Ele estar “em carne” ou “em glória”, e sim, de compreender Sua
mensagem de maneira carnal (centrada no meu “eu”) ou espiritual.
Voltemos ao Getsêmane:
Enquanto dormiam, Jesus começou a
desfigurar-se. Sua agonia era tão grande que Seus vasos sanguíneos se romperam
fazendo com que Seus poros jorrassem sangue.
Se no episódio anterior eles
puderam vislumbrar Sua divindade, agora perdiam a oportunidade de enxergá-lo na
plenitude de Sua humanidade. Quem antes Se transfigurara ante seus olhos, agora
Se desfigurava ante os olhos do Pai.
Nunca Jesus Se sentira tão só. Não
havia plateia para aquele espetáculo mórbido. Apenas o Pai o ouvia, porém, Seu
pedido não podia ser atendido. O que estava em jogo era o destino de toda a
criação. Atendê-lo em Sua súplica seria o mesmo que entregar o universo à sua
própria sorte.
- Pai, se for possível, passa de
mim este cálice...
Pausa na respiração.
- Mas que seja feita a Tua
vontade, não a minha.
O que desfigurou o semblante de
Jesus não foram os socos e pontapés recebidos dos guardas do Sinédrio e dos romanos,
mas Sua tristeza. Se o coração alegre
aformoseia o rosto, o que não faz um coração amargurado?
As primeiras gotas de sangue que
pagariam por nossa redenção não foram derramadas no Gólgota, mas no Getsêmane.
Não foram resultado das perfurações dos cravos ou da coroa de espinho, ou das
chicotadas, mas resultaram da luta hercúlea travada entre Sua carne e Seu Espírito.
Conforme Ele mesmo disse aos Seus discípulos numa das vezes em que os
repreendera: O espírito na verdade está pronto, mas a carne é fraca.
Sua carne tinha que render-se à
vontade do Espírito.
Luta diferente era travada entre
os três que acabaram se rendendo ao sono. Até que Jesus os acordou pela
terceira vez.
- Agora é tarde! Não há mais o
que fazer. Lá vem o traidor...
Pedro levantou-se assustado,
notou a aproximação de Judas que se fazia acompanhar por guardas do Sinédrio e
pensou consigo:
- Posso me redimir através de um
gesto heroico. Ele nem vai lembrar que estive dormindo quando mais precisou de
mim. Afinal, Ele não teria nos pedido que trouxéssemos espadas se não tivéssemos
que usá-las...
Num rompante, o pescador galileu desembainhou
a espada e golpeou um dos soldados com a clara intenção de matá-lo. Por sorte,
por estar ainda sonolento, seu reflexo falhou e, em vez de acertar o pescoço,
atingiu a orelha do soldado e a decepou.
Com a saliva de Judas ainda no
rosto, Jesus agachou-se, tomou a orelha decepada e a colocou no lugar. Este,
por sinal, foi Seu último milagre antes de ser crucificado.
Só deu tempo de dizer a Pedro:
- Guarda esta espada, rapaz! Quem
com ferro fere, com ferro será ferido!
O que Jesus espera de cada um de
nós não são atos heroicos, nem rompantes de valentia, mas tão-somente constância,
companheirismo, empatia, engajamento.
Horas depois, o mesmo Pedro O
negaria por três vezes no pátio onde aguardava o julgamento de Jesus. Os mesmos
que hoje se digladiam por um espaço sob os holofotes da mídia, quando as luzes
se apagam são os primeiros a negar tudo quanto afirmam defender.
Não se pode oscilar entre
heroísmo e indiferença, valentia e covardia. Há que se buscar uma espiritualidade
pautada na constância, que não careça de tocar alarde, de chamar a atenção para
si. Aquele tipo de engajamento indiscretamente discreto, em que a mão esquerda
ignore o que faça a direita.
Quando falo sobre isso, alguns me
contestam afirmando que como luz devemos ser colocados em lugar de destaque a
fim de iluminar todo o ambiente. Ok. Mas a luz não chama a atenção para si, e
sim para o objeto que pretende iluminar. Assim como o sal realça o sabor da
comida. Se salgar demais, estraga. É a isso que chamo “engajamento
indiscretamente discreto”.
Não precisamos sair por aí
comprando briga com qualquer segmento do qual discordemos. Mantenhamos a espada
na bainha. Chega de decepar orelhas! Chega de violar o direito do outro,
impondo nossa própria moral. Se tivermos que lutar, que seja pelo bem comum e
não pelo nosso próprio bem. E que, em vez de espadas afiadas na lima
ideológica, usemos tão-somente a espada do Espírito que é a Palavra de Deus,
lembrando que a mesma, por possuir dois gumes, corta tanto para lá quanto para
cá.
Muito bom texto
ResponderExcluirE que Deus nos ilumine os olhos do entendimento para que não caiamos no sono da indolência, e a Graça nos mantenha acordados para sermos participantes do sofrimento alheio. Que Deus continue a te abençoar +hermes
Ótima reflexão!
ResponderExcluirMas é lógico Hermes, cada um de nós seres humanos prestará conta com Deus pessoalmente no julgamenrto de Jesus, no juízo final, nossas ações e obras serão julgados. Isto ninguém vai escapar, nenhum ser humano, ninguém!
ResponderExcluirMas nas igreja evangélicas inclusive a sua, o negocio funciona assim: É todos por um e um por ninguém.
Ou seja: todos membros dão seus dízimos para igreja e seu líderes pançudos, e depois seus líderes pançudos dão bananas para todos os membros, um thau bem grande! E os chamam de trochas com já ouvi em uma enorme igreja IURD!
Hermes não devemos cortar orelha como Pedro fez, mas cortar as mãos desse pastores ladrões do povo de Deus isto é devido, é só levá-los aos países Árabes que eles fazem o serviçoi, isto de roubar? Lá ladrão é preso e cortam as mãos deles para nunca mais roubar de ninguém
É a lei de César, Daí de César o que é de César, Olho por olho dente por dente e ponto final.