Por Hermes C. Fernandes
Para boa parte dos cristãos,
salvação tem a ver com ir para o céu. De acordo com este pensamento, este
mundo é apenas uma arena onde decidimos o lugar em que desejamos passar a
eternidade, se no céu ou no inferno. Partindo desta premissa, construiu-se
toda uma gama de raciocínios centrada no indivíduo. Calvinismo, arminianismo,
ou mesmo universalismo, são linhas de raciocínio que partem desta mesma
premissa.
Nossas abordagens evangelísticas
caminham nesta direção. O calvinista crê que no final das contas, somente os eleitos
serão salvos, significando com isso que terão seu lugar assegurado no céu. O
arminiano se esforça para poder levar o máximo de pessoas, tendo em vista que a
responsabilidade por sua salvação é do próprio indivíduo. Portanto, quantos
mais ‘aceitarem’ a oferta de salvação, melhor. Seus esforços resultariam num
saquear o inferno e povoar o céu. O universalista prefere apostar no amor de
Deus que no final das contas vai liberar o céu para todo mundo.
Creio que todas essas linhas de
raciocínio partem de uma premissa equivocada.
O propósito de Deus abarca a
realidade como um todo. Uma vez que o pecado trouxe danos a toda criação, a
redenção proposta em Jesus deve ter a mesma abrangência, conforme lemos em
Paulo:
“Pois foi do agrado do Pai que toda a
plenitude nele habitasse, e que, havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua
cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo TODAS AS COISAS, tanto as que
estão na terra como as que estão nos céus.” Colossenses 1:19-20
“E desvendou-nos o mistério da sua vontade,
segundo o bom propósito que propusera em Cristo, de fazer convergir em Cristo
todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tmepos, tantos as que estão
nos céus como as que estão na terra.” Efésios 1:9-10
O Criador almeja restaurar Sua
obra por completo. A salvação do indivíduo é parte do processo e consiste em
recrutá-lo como agente parceiro nesta obra de restauração. Por isso, na
continuidade da passagem que citamos acima, Paulo diz que fomos “selados com o Espírito Santo da promessa,
que é o penhor da nossa herança, para REDENÇÃO DA PROPRIEDADE DE DEUS, em louvor
da sua glória” (VV.13b-14).
Que propriedade de Deus seria
esta que Ele enseja redimir? A mesma a que se refere em 1 Coríntios 3:21-23:
“...Tudo é vosso; seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas, seja o mundo, seja
a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro; tudo é vosso,
e vós de Cristo, e Cristo de Deus.”
O que está realmente em jogo não
é simplesmente o futuro do indivíduo (céu ou inferno), mas o futuro da criação
(restauração ou aniquilação). Ser salvo é ter a vida integrada a este propósito
de redenção de tudo. O contrário disso é desperdiçar a existência.
O inferno representa o depósito
de lixo cósmico, onde toda existência desperdiçada será descartada. O céu, ao
contrário, é a plenificação do propósito, o lugar de convergência, de
reintegração, de conclusão. Não se trata de um espaço geográfico em alguma
dimensão etérea. O céu não estaria acima de nós, mas à nossa frente. Tem mais a
ver com um tempo do que com um espaço. Aquele tempo em que Deus será tudo em
todos (1 Co.15:28); em que a harmonia perdida por causa do pecado será restaurada.
Para que a terra seja restaurada,
o homem deve ser salvo de sua condição de predador insaciável e redescobrir seu
papel original de cuidador, destinado a ser seu guardião, que tanto lavra
quanto protege, tanto cuida quanto desenvolve (Gn.2:15). Era assim que Paulo se enxergava: alguém que foi alcançado por Deus para
trabalhar em Sua lavoura (2 Tm.2:6; 1 Co.3:6-9) e ser participante de Seu
projeto redentor.
Uma vez salvo, o homem deixa de
viver para si mesmo, errando o alvo de sua existência (tal é o peado essencial), e
passa a viver em função da glória de Deus e das gerações futuras (2 Co.5:15;
Ef.2:7). O que lhe interessa não é mais aproveitar ao máximo o que a terra lhe
oferece, mas garantir que as próximas gerações não sejam privadas da vida
abundante proporcionada no encontro entre céu e terra, entre espiritualidade e
vocação.
Livre da alienação, o homem
compreende que a vida continua após sua partida deste mundo. A vida prossegue
naqueles que receberão seu DNA e que serão imbuídos do mesmo propósito. A tocha
que houvermos carregado durante nossa carreira existencial será passada a
outros que darão continuidade ao projeto de restauração do mundo, conscientes
de que não poderão deixar que sua chama se apague (1 Sm.3:3).
E quanto à nossa alma? Para onde
vamos ao morrer?
Seremos reintegrados à fonte
primeva. Parafraseando o escritor sagrado, o corpo voltará para o pó, se
dissolverá, de modo que nossas partículas passem a fazer parte de outras
estruturas, mas o espírito, a essência, voltará para Deus, sua origem (Ec.12:7). Com a essência, nossa consciência será
preservada juntamente com nossa individualidade, e receberá um novo corpo, apto às condições da criação restaurada. Se nossa existência não houver
sido desperdiçada, ela será absorvida por nossa essência. Nas palavras de
Paulo, o mortal será absorvido pela imortalidade (2 Co.5:4). Porém, se a
houvermos desperdiçado vivendo exclusivamente em função de nossos prazeres e
interesses, então, nossa existência se perderá para sempre. Nossas obras se
dissolverão no fogo do juízo divino. Todavia, nossa essência será preservada.
Seremos, por assim dizer, “salvos como
pelo fogo” (1 Co.3:15).
Por fim, toda a criação será
restaurada. Nada ficará fora do escopo desta reconciliação.
Isso quer dizer que todos serão
salvos? Depende do que chamamos de salvação. Se entendermos o ser humano como
um ser histórico e metahistórico, compreendendo sua vida a partir do binômio
existência/essência, podemos afirmar que a salvação num sentido restrito tem a
ver com sua história, sua biografia, com a maneira como o homem aproveitou a
oportunidade que a vida lhe ofereceu. Mas num sentido mais amplo, a salvação
pode ser concebida como a redenção da essência, daquilo que precede e
transcende a história (daí a expressão metahistória). Para fins didáticos,
prefiro referir-me a esta salvação essencial como reconciliação final.
Distinguindo “salvação” de “reconciliação
final” fica mais fácil compreender. Nem todos serão salvos. Porém, todos serão
reconciliados.
“Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra. E toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.” Filipenses 2:10-11
Mesmo os que estiverem “debaixo da
terra” (alusão clara ao inferno), terão suas consciências reconciliadas com
Deus, admitindo que suas más obras lhos fizeram merecedores de tal condenação.
Sobre isso, Judas afirma que o Senhor executará juízo sobre todos e fará
convictos todos os ímpios “de todas as
obras de impiedade, que impiamente cometeram, e de todas as duras palavras que
ímpios pecadores contra ele proferiram” (Jd.1:14-15).
E não apenas isso. Além de admitir seus pecadores e o senhorio de Cristo, eles O louvarão! O coral que aparece nas páginas do Apocalipse louvando ao Cordeiro é formado por seres de todas as esferas, tanto do céu, como da terra e debaixo da terra:
E não apenas isso. Além de admitir seus pecadores e o senhorio de Cristo, eles O louvarão! O coral que aparece nas páginas do Apocalipse louvando ao Cordeiro é formado por seres de todas as esferas, tanto do céu, como da terra e debaixo da terra:
“E ouvi a toda a criatura que está no céu, e na
terra, e debaixo da terra, e que estão no mar, e a todas as coisas que neles
há, dizer: Ao que está assentado sobre o trono, e ao Cordeiro, sejam dadas
ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre.”
Apocalipse 5:13
Apocalipse 5:13
Ora, se todos serão integrantes
deste coral, qual a vantagem de sermos salvos? Esta pergunta vem contaminada
pela premissa que apresentei logo no início deste artigo. Não podemos pensar em
termos de vantagens e desvantagens. Todavia, os que houverem sido alcançados
pela salvação em sua existência serão aqueles cujas obras seguir-lhes-ão depois
que partirem (Ap.14:13). Enquanto os demais terão suas obras dissolvidas pelo
fogo do juízo divino.
Os salvos gozarão da companhia imediata de Cristo e se
regozijarão por terem sido partícipes do projeto divino de restauração de todas
as coisas. Suas obras não serão desperdiçadas, nem carcomidas pelo tempo. Seus
tesouros terão sido ajuntados no céu. Tudo quanto houverem sofrido por amor à justiça
terá valido a pena.
Não obstante, jamais nos esqueçamos de que “fiel é esta palavra e digna de toda aceitação. Pois para isto é que trabalhamos e lutamos,
porque temos posto a nossa esperança no Deus vivo, que é o Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem” (1 Tm.4:9-10).
Em
vez de ficarmos debatendo se Ele salvará a alguns que Ele mesmo houver
escolhido, ou alguns que O escolherem ou simplesmente a todos, arregacemos as
mangas e trabalhemos até que Ele mesmo desponte no céu em grande glória, pois “convém que o céu o contenha até a
restauração de todas as coisas” (At.3:21).
É isso aí Bispo!!!!!! Excelente!!!!!
ResponderExcluirBoa Hermes....boa.
ResponderExcluirNão vamos pre ocupar nosso pensamentos com discussões infindáveis. Podemos aprender com todos as linhas de pensamento, porem sabemos bem que o que nasce da carne é carne...
Abraços brother!!!!
Excelente texto. O estéril debate entre calvinismo e arminianismo também é resultado de se partir do equivocado pressuposto de que, para Deus, o tempo é linear (tema que já foi explorado em outras nuances em texto anterior). Abs
ResponderExcluirMuito bom bispo!! A única certeza que possuo é que Jesus de Nazaré, o Verbo vivo, é Senhor da minha vida e Salvador da minha alma, estendeu-me a graça e me resgatou de todos os mares de lama em que já nadei, perdoando meus pecados por mérito da Cruz e da Cruz somente.
ResponderExcluirTexto fora de contexto por pretexto é terrível.
ResponderExcluirTanto a citação de Efésios 1 quanto de 1 Coríntios 3 falam de uma redenção da propriedade de Deus, que pelos seus contextos ficam extremamente claros: os eleitos, ou seja, a verdadeira igreja, os que foram alcançados pela graça salvadora, creram e viveram para a glória de Deus.
Esse seu universalismo disfarçado, com esse inferno etéreo onde só haverá "lixo cósmico" (carcaça de foguete ou sonda espacial?) está de matar.
Além, ó óbvio, de Moltmann nortear todo o seu pensamento sobre a parousia.
Mas, como você mesmo disse, o que importa? Arregacemos as mangas e paremos de nos destroçar com picuinhas teológicas, coisa que esse artigo fez do início ao fim.
Parabéns, bispo!
André
Sim , arregaçamos as mangas ... mas o que acontecerá com aqueles que "não deram ouvidos a nossa pregação"?
ExcluirIsso!!
ResponderExcluir...só que quando falo, sou chamada de universalista do mesmo jeito! rs
Crente não gosta da ideia de não ver pessoas queimando eternamente num inferno físico, com muito choro e ranger de dentes!
Excelente matéria e explanação.Posso dizer que penso exatamente desta forma,mas o Bispo Hermes,com seu estilo muito conciso e,ao mesmo tempo,profundo,conseguiu explicar com facilidade algo que salta os olhos nas Escrituras,mas que muitos,por amarem as "discussões infindáveis" e "fábulas de velhas caducas"(Ap.Paulo),acabam se perdendo em "loquacidade frívola e a nenhum lugar chegam.Parabéns,sempre querido e admirado irmão!!A Paz do Senhor seja com seu espírito!
ResponderExcluirGrato sou, por haver alguém disposta a dar Maná na boca escancarada de aluns, entre eles eu, e, ainda aparecem aqueles, cujos buchos cheios e incapacitados de assimilarem o preciosíssimo alimento, arrotam bacaba; assemelham-se ao homem que indo ao campo colher trigo; come a palha e joga fora a semente.
ResponderExcluir"vantagens e desvantagens" .
ResponderExcluirPaulo diz "... prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus" (Fl 3:14) ... "... o atleta não é coroado se não lutar segundo as normas" ... "Já agora a coroa da justiça me está guardada... (2Tm 2:5 , 4:8) .
Em outra passagem Paulo compara a nossa corrida para a salvação, com as dos atletas grego-romanos, ... e o prêmio que nos espera.
Segundo a loucura dos filósofos e da Nova Era, nestes fins de tempo, é feio se ter interesse em ser salvo ... se todos não o forem.
Anos atrás, procurei na saída de uma reunião de estudos, acompanhar um dos participantes, na saída, e caminhei ao seu lado por uns 200m., pois me simpatizei com ele e queria a sua amizade. Lá pelas tantas e lascou, em tom de critica a mim, abordando um tema seu: - "Tu estás ao meu lado por interesse !" .
Refleti rapidamente e retruquei: "Quem não tem interesse?", e de continuo argumentei: "Só doido não tem interesse ... e os hospícios estão cheios deles".
Os filósofos, sociólogos, comunistas e outros "construtores do novo homem" da Nova Era, metidos a altruístas quando não passam de hipócritas, idealizam um homem impessoal, coletivo e robotizado.
Objetivam eles, como Satanás, nos impingir esta e outras asneira: - o desinteresse pelos nossos mais altos objetivos (sendo que a salvação é a principal).
O Senhor Deus pôs em nosso coração, entre outras coisas, o interesse; e quero preservar isto eternamente.
Belo e proveitoso texto meu amigo Hermes. Parabéns! - Paz! Forte abraço.
Desculpem os que, livremente, pensam diferentemente. Revela-se de facílima, impressionante e lastimável percepção, e assim o declaro com igual e inquestionável liberdade de pensamento e de expressão, que o calvinismo é um rótulo sem sentido. O calvinismo deprime. O calvinismo é deprimente. O calvinismo deturpa a Bíblia. O calvinismo parafraseia a Bíblia. O calvinismo adapta a Bíblia. O calvinismo é vaidade pura, embora sequazes do francês queiram a todo custo sugerir o contrário teclando insistentemente na soberania de Deus. O calvinismo é coisa típica de homens. O calvinismo é invento de calvinistas. O calvinismo é modismo de pessoas que se converteram às apologias do cidadão que comandou o Conselho de Genebra. O calvinismo anula os incontáveis chamados Bíblicos, embora eles, calvinistas, sempre digam o contrário. O calvinismo inegavelmente é um dístico sem sentido. Obviamente, ninguém necessita ser "calvinista" para tornar-se cristão. Ninguém necessita fazer-se "calvinista" para ser salvo pelo SANGUE DO CORDEIRO DE DEUS. Ninguém necessita ser "calvinista" para mostrar-se elegante. Ninguém necessita ser "calvinista" para apresentar-se sábio. Ninguém necessita ser "calvinista" para obter sucesso ou êxito na vida. Ninguém necessita ser "calvinista" para COISA NENHUMA. Isso, claro, exclusivamente EM NOSSOS DIAS, ou seja, NOS DIAS ATUAIS, porque ao tempo de Calvino quem não se declarasse "calvinista" seria considerado herege, isto é, praticante de crime de heresia, e, por conseqüência, forçosamente e impiedosamente submetido a julgamento sumário, culminando com condenação por um Conselho espúrio e ridículo (sob a liderança ou influência de João Calvino) a morrer QUEIMADO AMARRADO A UMA ESTACA, exatamente como esse gaulês protagonizou em relação a um cristão respeitável chamado MIGUEL SERVETO, cuja estátua post mortem foi erguida na França, ao qual fora imputado o imperdoável e hediondo delito consistente em tão-somente haver, a pedido do próprio João Calvino, expressado seu ponto de vista em relação a determinados aspectos doutrinários integrantes das teses que Calvino pretendia transformar em "Institutas da Religião Cristã".
ResponderExcluirHermes só tirar uma duvida.
ResponderExcluirCalvinismo é o cara que fica calvo no cabelo da cabeça?
Explica isso aí porque eu estudo na pátria educadora e não entendo isso.
Complicaram os ensinamentos de Jesus : tanto "ismos" que não estão na Bíblia!!!
ResponderExcluir"ismos" : doutrinas dos homens!
ResponderExcluirEu sou Eugenio: este texto é confuso e temerário, o próprio Apóstolo Paulo disse que tinha medo de perder a salvação, Jesus fala que, quem crer e for "batizado" será salvo, porém quem não crer já está condenado.
ResponderExcluirNão ficou muito claro pra mim se todos serão salvos. É também em q consistiria a condenação ao inferno.
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