quarta-feira, fevereiro 03, 2016

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Salvação para além do calvinismo, arminianismo e universalismo




Por Hermes C. Fernandes

Para boa parte dos cristãos, salvação tem a ver com ir para o céu. De acordo com este pensamento, este mundo é apenas uma arena onde decidimos o lugar em que desejamos passar a eternidade, se no céu ou no inferno. Partindo desta premissa, construiu-se toda uma gama de raciocínios centrada no indivíduo. Calvinismo, arminianismo, ou mesmo universalismo, são linhas de raciocínio que partem desta mesma premissa.

Nossas abordagens evangelísticas caminham nesta direção. O calvinista crê que no final das contas, somente os eleitos serão salvos, significando com isso que terão seu lugar assegurado no céu. O arminiano se esforça para poder levar o máximo de pessoas, tendo em vista que a responsabilidade por sua salvação é do próprio indivíduo. Portanto, quantos mais ‘aceitarem’ a oferta de salvação, melhor. Seus esforços resultariam num saquear o inferno e povoar o céu. O universalista prefere apostar no amor de Deus que no final das contas vai liberar o céu para todo mundo.

Creio que todas essas linhas de raciocínio partem de uma premissa equivocada.

O propósito de Deus abarca a realidade como um todo. Uma vez que o pecado trouxe danos a toda criação, a redenção proposta em Jesus deve ter a mesma abrangência, conforme lemos em Paulo:

“Pois foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse, e que, havendo por ele feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo TODAS AS COISAS, tanto as que estão na terra como as que estão nos céus.” Colossenses 1:19-20

“E desvendou-nos o mistério da sua vontade, segundo o bom propósito que propusera em Cristo, de fazer convergir em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tmepos, tantos as que estão nos céus como as que estão na terra.” Efésios 1:9-10

O Criador almeja restaurar Sua obra por completo. A salvação do indivíduo é parte do processo e consiste em recrutá-lo como agente parceiro nesta obra de restauração. Por isso, na continuidade da passagem que citamos acima, Paulo diz que fomos “selados com o Espírito Santo da promessa, que é o penhor da nossa herança, para REDENÇÃO DA PROPRIEDADE DE DEUS, em louvor da sua glória” (VV.13b-14).

Que propriedade de Deus seria esta que Ele enseja redimir? A mesma a que se refere em 1 Coríntios 3:21-23:

 “...Tudo é vosso; seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas, seja o mundo, seja a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro; tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus.

O que está realmente em jogo não é simplesmente o futuro do indivíduo (céu ou inferno), mas o futuro da criação (restauração ou aniquilação). Ser salvo é ter a vida integrada a este propósito de redenção de tudo. O contrário disso é desperdiçar a existência.

O inferno representa o depósito de lixo cósmico, onde toda existência desperdiçada será descartada. O céu, ao contrário, é a plenificação do propósito, o lugar de convergência, de reintegração, de conclusão. Não se trata de um espaço geográfico em alguma dimensão etérea. O céu não estaria acima de nós, mas à nossa frente. Tem mais a ver com um tempo do que com um espaço. Aquele tempo em que Deus será tudo em todos (1 Co.15:28); em que a harmonia perdida por causa do pecado será restaurada.

Para que a terra seja restaurada, o homem deve ser salvo de sua condição de predador insaciável e redescobrir seu papel original de cuidador, destinado a ser seu guardião, que tanto lavra quanto protege, tanto cuida quanto desenvolve (Gn.2:15). Era assim que Paulo se enxergava:  alguém que foi alcançado por Deus para trabalhar em Sua lavoura (2 Tm.2:6; 1 Co.3:6-9) e ser participante de Seu projeto redentor.

Uma vez salvo, o homem deixa de viver para si mesmo, errando o alvo de sua existência (tal é o peado essencial), e passa a viver em função da glória de Deus e das gerações futuras (2 Co.5:15; Ef.2:7). O que lhe interessa não é mais aproveitar ao máximo o que a terra lhe oferece, mas garantir que as próximas gerações não sejam privadas da vida abundante proporcionada no encontro entre céu e terra, entre espiritualidade e vocação.

Livre da alienação, o homem compreende que a vida continua após sua partida deste mundo. A vida prossegue naqueles que receberão seu DNA e que serão imbuídos do mesmo propósito. A tocha que houvermos carregado durante nossa carreira existencial será passada a outros que darão continuidade ao projeto de restauração do mundo, conscientes de que não poderão deixar que sua chama se apague (1 Sm.3:3).

E quanto à nossa alma? Para onde vamos ao morrer?

Seremos reintegrados à fonte primeva. Parafraseando o escritor sagrado, o corpo voltará para o pó, se dissolverá, de modo que nossas partículas passem a fazer parte de outras estruturas, mas o espírito, a essência, voltará para Deus, sua origem (Ec.12:7).  Com a essência, nossa consciência será preservada juntamente com nossa individualidade, e receberá um novo corpo, apto às condições da criação restaurada. Se nossa existência não houver sido desperdiçada, ela será absorvida por nossa essência. Nas palavras de Paulo, o mortal será absorvido pela imortalidade (2 Co.5:4). Porém, se a houvermos desperdiçado vivendo exclusivamente em função de nossos prazeres e interesses, então, nossa existência se perderá para sempre. Nossas obras se dissolverão no fogo do juízo divino. Todavia, nossa essência será preservada. Seremos, por assim dizer, “salvos como pelo fogo” (1 Co.3:15).

Por fim, toda a criação será restaurada. Nada ficará fora do escopo desta reconciliação.

Isso quer dizer que todos serão salvos? Depende do que chamamos de salvação. Se entendermos o ser humano como um ser histórico e metahistórico, compreendendo sua vida a partir do binômio existência/essência, podemos afirmar que a salvação num sentido restrito tem a ver com sua história, sua biografia, com a maneira como o homem aproveitou a oportunidade que a vida lhe ofereceu. Mas num sentido mais amplo, a salvação pode ser concebida como a redenção da essência, daquilo que precede e transcende a história (daí a expressão metahistória). Para fins didáticos, prefiro referir-me a esta salvação essencial como reconciliação final.

Distinguindo “salvação” de “reconciliação final” fica mais fácil compreender. Nem todos serão salvos. Porém, todos serão reconciliados.
 “Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra. E toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.” Filipenses 2:10-11
Mesmo os que estiverem “debaixo da terra” (alusão clara ao inferno), terão suas consciências reconciliadas com Deus, admitindo que suas más obras lhos fizeram merecedores de tal condenação. Sobre isso, Judas afirma que o Senhor executará juízo sobre todos e fará convictos todos os ímpios “de todas as obras de impiedade, que impiamente cometeram, e de todas as duras palavras que ímpios pecadores contra ele proferiram” (Jd.1:14-15).

E não apenas isso. Além de admitir seus pecadores e o senhorio de Cristo, eles O louvarão! O coral que aparece nas páginas do Apocalipse louvando ao Cordeiro é formado por seres de todas as esferas, tanto do céu, como da terra e debaixo da terra:

“E ouvi a toda a criatura que está no céu, e na terra, e debaixo da terra, e que estão no mar, e a todas as coisas que neles há, dizer: Ao que está assentado sobre o trono, e ao Cordeiro, sejam dadas ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre.”
Apocalipse 5:13

Ora, se todos serão integrantes deste coral, qual a vantagem de sermos salvos? Esta pergunta vem contaminada pela premissa que apresentei logo no início deste artigo. Não podemos pensar em termos de vantagens e desvantagens. Todavia, os que houverem sido alcançados pela salvação em sua existência serão aqueles cujas obras seguir-lhes-ão depois que partirem (Ap.14:13). Enquanto os demais terão suas obras dissolvidas pelo fogo do juízo divino.

Os salvos gozarão da companhia imediata de Cristo e se regozijarão por terem sido partícipes do projeto divino de restauração de todas as coisas. Suas obras não serão desperdiçadas, nem carcomidas pelo tempo. Seus tesouros terão sido ajuntados no céu. Tudo quanto houverem sofrido por amor à justiça terá valido a pena.

Não obstante, jamais nos esqueçamos de que fiel é esta palavra e digna de toda aceitação. Pois para isto é que trabalhamos e lutamos, porque temos posto a nossa esperança no Deus vivo, que é o Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem(1 Tm.4:9-10).

Em vez de ficarmos debatendo se Ele salvará a alguns que Ele mesmo houver escolhido, ou alguns que O escolherem ou simplesmente a todos, arregacemos as mangas e trabalhemos até que Ele mesmo desponte no céu em grande glória, pois “convém que o céu o contenha até a restauração de todas as coisas” (At.3:21). 

16 comentários:

  1. É isso aí Bispo!!!!!! Excelente!!!!!

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  2. Boa Hermes....boa.

    Não vamos pre ocupar nosso pensamentos com discussões infindáveis. Podemos aprender com todos as linhas de pensamento, porem sabemos bem que o que nasce da carne é carne...

    Abraços brother!!!!

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  3. Darlington2:33 PM

    Excelente texto. O estéril debate entre calvinismo e arminianismo também é resultado de se partir do equivocado pressuposto de que, para Deus, o tempo é linear (tema que já foi explorado em outras nuances em texto anterior). Abs

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  4. Jander Costa1:54 PM

    Muito bom bispo!! A única certeza que possuo é que Jesus de Nazaré, o Verbo vivo, é Senhor da minha vida e Salvador da minha alma, estendeu-me a graça e me resgatou de todos os mares de lama em que já nadei, perdoando meus pecados por mérito da Cruz e da Cruz somente.

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  5. Anônimo5:04 PM

    Texto fora de contexto por pretexto é terrível.

    Tanto a citação de Efésios 1 quanto de 1 Coríntios 3 falam de uma redenção da propriedade de Deus, que pelos seus contextos ficam extremamente claros: os eleitos, ou seja, a verdadeira igreja, os que foram alcançados pela graça salvadora, creram e viveram para a glória de Deus.

    Esse seu universalismo disfarçado, com esse inferno etéreo onde só haverá "lixo cósmico" (carcaça de foguete ou sonda espacial?) está de matar.

    Além, ó óbvio, de Moltmann nortear todo o seu pensamento sobre a parousia.

    Mas, como você mesmo disse, o que importa? Arregacemos as mangas e paremos de nos destroçar com picuinhas teológicas, coisa que esse artigo fez do início ao fim.

    Parabéns, bispo!

    André

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    1. Anônimo6:45 PM

      Sim , arregaçamos as mangas ... mas o que acontecerá com aqueles que "não deram ouvidos a nossa pregação"?

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  6. tarsila lima8:43 PM

    Isso!!
    ...só que quando falo, sou chamada de universalista do mesmo jeito! rs
    Crente não gosta da ideia de não ver pessoas queimando eternamente num inferno físico, com muito choro e ranger de dentes!

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  7. Excelente matéria e explanação.Posso dizer que penso exatamente desta forma,mas o Bispo Hermes,com seu estilo muito conciso e,ao mesmo tempo,profundo,conseguiu explicar com facilidade algo que salta os olhos nas Escrituras,mas que muitos,por amarem as "discussões infindáveis" e "fábulas de velhas caducas"(Ap.Paulo),acabam se perdendo em "loquacidade frívola e a nenhum lugar chegam.Parabéns,sempre querido e admirado irmão!!A Paz do Senhor seja com seu espírito!

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  8. Anônimo5:58 PM

    Grato sou, por haver alguém disposta a dar Maná na boca escancarada de aluns, entre eles eu, e, ainda aparecem aqueles, cujos buchos cheios e incapacitados de assimilarem o preciosíssimo alimento, arrotam bacaba; assemelham-se ao homem que indo ao campo colher trigo; come a palha e joga fora a semente.

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  9. "vantagens e desvantagens" .
    Paulo diz "... prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus" (Fl 3:14) ... "... o atleta não é coroado se não lutar segundo as normas" ... "Já agora a coroa da justiça me está guardada... (2Tm 2:5 , 4:8) .
    Em outra passagem Paulo compara a nossa corrida para a salvação, com as dos atletas grego-romanos, ... e o prêmio que nos espera.
    Segundo a loucura dos filósofos e da Nova Era, nestes fins de tempo, é feio se ter interesse em ser salvo ... se todos não o forem.
    Anos atrás, procurei na saída de uma reunião de estudos, acompanhar um dos participantes, na saída, e caminhei ao seu lado por uns 200m., pois me simpatizei com ele e queria a sua amizade. Lá pelas tantas e lascou, em tom de critica a mim, abordando um tema seu: - "Tu estás ao meu lado por interesse !" .
    Refleti rapidamente e retruquei: "Quem não tem interesse?", e de continuo argumentei: "Só doido não tem interesse ... e os hospícios estão cheios deles".
    Os filósofos, sociólogos, comunistas e outros "construtores do novo homem" da Nova Era, metidos a altruístas quando não passam de hipócritas, idealizam um homem impessoal, coletivo e robotizado.
    Objetivam eles, como Satanás, nos impingir esta e outras asneira: - o desinteresse pelos nossos mais altos objetivos (sendo que a salvação é a principal).
    O Senhor Deus pôs em nosso coração, entre outras coisas, o interesse; e quero preservar isto eternamente.
    Belo e proveitoso texto meu amigo Hermes. Parabéns! - Paz! Forte abraço.

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  10. Desculpem os que, livremente, pensam diferentemente. Revela-se de facílima, impressionante e lastimável percepção, e assim o declaro com igual e inquestionável liberdade de pensamento e de expressão, que o calvinismo é um rótulo sem sentido. O calvinismo deprime. O calvinismo é deprimente. O calvinismo deturpa a Bíblia. O calvinismo parafraseia a Bíblia. O calvinismo adapta a Bíblia. O calvinismo é vaidade pura, embora sequazes do francês queiram a todo custo sugerir o contrário teclando insistentemente na soberania de Deus. O calvinismo é coisa típica de homens. O calvinismo é invento de calvinistas. O calvinismo é modismo de pessoas que se converteram às apologias do cidadão que comandou o Conselho de Genebra. O calvinismo anula os incontáveis chamados Bíblicos, embora eles, calvinistas, sempre digam o contrário. O calvinismo inegavelmente é um dístico sem sentido. Obviamente, ninguém necessita ser "calvinista" para tornar-se cristão. Ninguém necessita fazer-se "calvinista" para ser salvo pelo SANGUE DO CORDEIRO DE DEUS. Ninguém necessita ser "calvinista" para mostrar-se elegante. Ninguém necessita ser "calvinista" para apresentar-se sábio. Ninguém necessita ser "calvinista" para obter sucesso ou êxito na vida. Ninguém necessita ser "calvinista" para COISA NENHUMA. Isso, claro, exclusivamente EM NOSSOS DIAS, ou seja, NOS DIAS ATUAIS, porque ao tempo de Calvino quem não se declarasse "calvinista" seria considerado herege, isto é, praticante de crime de heresia, e, por conseqüência, forçosamente e impiedosamente submetido a julgamento sumário, culminando com condenação por um Conselho espúrio e ridículo (sob a liderança ou influência de João Calvino) a morrer QUEIMADO AMARRADO A UMA ESTACA, exatamente como esse gaulês protagonizou em relação a um cristão respeitável chamado MIGUEL SERVETO, cuja estátua post mortem foi erguida na França, ao qual fora imputado o imperdoável e hediondo delito consistente em tão-somente haver, a pedido do próprio João Calvino, expressado seu ponto de vista em relação a determinados aspectos doutrinários integrantes das teses que Calvino pretendia transformar em "Institutas da Religião Cristã".

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  11. Anônimo2:51 PM

    Hermes só tirar uma duvida.
    Calvinismo é o cara que fica calvo no cabelo da cabeça?
    Explica isso aí porque eu estudo na pátria educadora e não entendo isso.

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  12. Anônimo11:48 PM

    Complicaram os ensinamentos de Jesus : tanto "ismos" que não estão na Bíblia!!!

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  13. Anônimo11:48 PM

    "ismos" : doutrinas dos homens!

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  14. Anônimo3:12 PM

    Eu sou Eugenio: este texto é confuso e temerário, o próprio Apóstolo Paulo disse que tinha medo de perder a salvação, Jesus fala que, quem crer e for "batizado" será salvo, porém quem não crer já está condenado.

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  15. Não ficou muito claro pra mim se todos serão salvos. É também em q consistiria a condenação ao inferno.

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