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domingo, janeiro 27, 2008

Encontro de Gerações - Parte 1

Convertendo Pais aos Filhos e Filhos aos Pais

“Vede, eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o dia grande e terrível do Senhor. Ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos aos pais, para que não venha e fira a terra com maldição”. Malaquias 4:5-6

Com estes versículos, encerra-se o Antigo Testamento. Foram cerca de quatrocentos anos de silêncio. Muitas coisas aconteceram nesse ínterim. Levantaram-se heróis, como os Macabeus, impérios ruíram, e outros se ergueram. Porém, não houve voz profética. Cessaram-se os oráculos. Desapareceram os videntes. Parecia que Deus havia se ausentado definitivamente da História, e abandonado a humanidade à própria sorte.

O Novo Testamento começa com o relato dos quatro Evangelhos, acerca da vida, mensagem e ministério de Jesus. Mateus parte da genealogia de Jesus, para demonstrar Sua origem terrena. João parte de Sua origem celestial, demonstrando que tudo quanto existe, fora feito por meio d’Ele. Mas Marcos e Lucas têm outro ponto de partida. Era como se eles quisessem estabelecer uma conexão com o Antigo Testamento, partindo de onde ele parara. A diferença entre ambos é que Marcos parte do ministério de João Batista, enquanto Lucas parte do anúncio do seu nascimento.

A meu ver, é Lucas quem demonstra de maneira mais contundente a ligação entre os dois testamentos. Se seu Evangelho fosse o primeiro da lista, todos perceberiam facilmente que ele começa, onde Malaquias parou.

O anjo que aparece a Zacarias para lhe anunciar o nascimento de João, diz:

“E converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus. Irá adiante dele no espírito e poder de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos, converter os rebeldes à prudência dos justos, e preparar ao Senhor um povo bem disposto”. Lucas 1:16-17

De fato, João Batista era o Elias prometido por Deus na conclusão do Antigo Testamento. Sua missão era preparar o caminho do Senhor, convertendo o coração dos pais aos filhos, e dos filhos aos pais. E se alguém ousar duvidar disso, ouça o que o próprio Jesus diz acerca de João: “E, se quiserdes dar crédito, ele é o Elias que havia de vir” (Mt.11:14).

Malaquias não foi o único a profetizar sua chegada. Isaías também a profetizou. E Lucas também apresenta a conexão entre o ministério de João Batista, e o cumprimento da profecia de Isaías. Ele era a “voz do que clama no deserto”, cujo objetivo era o de preparar “o caminho do Senhor”, endireitando “as suas veredas”. E a conseqüência de seu ministério é que “todo vale se encherá, e se abaixará todo monte e outeiro. O que é tortuoso se endireitará, e os caminhos escabrosos se aplanarão. E toda a humanidade verá a salvação de Deus” (Lc.3:4-6).

Deus contempla a humanidade como um terreno acidentado. De lado, montanhas, do outro lado, vales, e entre eles, abismos. As montanhas representam os pais, as gerações anteriores, com o seu acúmulo de experiência de vida. Os vales representam os filhos, nas novas gerações. Para desfazer os abismos entre eles, é necessário que o terreno seja nivelado. Esta era a missão do último profeta da Antiga Aliança.

Quem diria que aquele profeta excêntrico que se alimentava de mel e gafanhoto tinha uma missão tão nobre e importante? Não foi em vão que Jesus o classificou como o maior dentre todos os nascidos de mulher, o último dos profetas (Mt.11:11,13).

Vamos nos ater à sua missão em abrir caminho para que toda a humanidade conhecesse a salvação.

Segundo as Escrituras, o meio que João usaria para preparar o caminho do Senhor seria convertendo pais aos filhos e filhos aos pais. Mas como isso seria feito?

Geralmente, João era duro em seu discurso. Denunciava o abuso de poder das autoridades. Chamava seus contemporâneos de víboras, e de outros apelidos nada carinhosos. Ordenava-lhes a que se convertessem, arrependendo-se de seus pecados. João nunca fez média com ninguém, nem mesmo com Herodes (Mc.6:18). E foi justamente isso que lhe custou a vida (Mc.6:14-29).

Não encontramos em nenhum dos seus discursos uma única palavra acerca da relação entre pais e filhos.

Então, como ele poderia convertê-los uns aos outros? Será que João se distraiu com outras coisas, e acabou se esquecendo que seu principal propósito era o de converter gerações?
Primeiro, vamos examinar o significado dessa “conversão”.

No anúncio feito pelo anjo a Zacarias, há uma paráfrase do que fora anunciado originalmente por Malaquias. Em vez de repetir literalmente o que o profeta dissera, o anjo diz que a tarefa de João seria a de converter os pais aos filhos e de “converter os rebeldes à prudência dos justos” ( Lc.1:16-17). Ele não fala de converter os filhos aos pais, e sim, os rebeldes à prudência.
Rebeldia e prudência são coisas bem distintas. Rebeldia está mais associada aos jovens, principalmente aos adolescentes. Já a prudência é característica marcante dos mais experientes. É a experiência de vida que nos torna pessoas mais prudentes.

Todos já tivemos nossa época contestação. Geralmente, quando adolescentes, somos “rebeldes sem causa”, ao chegar à fase adulta, deixamo-nos domesticar pelo sistema, e nos tornamos pessoas conformadas ao mundo. Deveríamos nos tornar “rebeldes com causa”, e mais, “rebeldes com uma boa causa”, a causa do reino de Deus e de sua justiça.

Não há nada de errado em ser rebelde, desde que nossa rebeldia seja direcionada contra tudo o que oprime, destrói, desumaniza, e entristece o coração de Deus.

Quando adicionamos a rebeldia da juventude à prudência da maturidade, temos uma química imbatível, uma espécie de rebeldia prudente, ou prudência rebelde.

Assim como os filhos devem converter sua rebeldia à prudência de seus pais, os pais devem converter sua prudência à rebeldia dos filhos.

O anjo faz um trocadilho proposital.

O que a nova geração precisa, a geração anterior tem de sobra. O que a geração de nossos pais necessita, nossa geração tem “pra dar e vender”.

A revolução acontecerá quando conseguirmos unir as duas coisas. A prudência dos pais, sem o elemento de rebeldia dos filhos, corre o risco de se tornar cinismo, descrença e comodismo. Assim também, a rebeldia dos filhos, sem a adição da prudência dos pais, se tornará numa rebeldia “sem causa”, ou ainda, “sem efeito”. Pior que rebeldia sem causa, é rebeldia sem efeito, ou, pelo menos, sem o efeito esperado.

Pais e filhos devem ser parceiros na transformação do mundo.

A rebeldia da juventude será um revigorante para os mais velhos.
A prudência dos mais velhos será um abalizador para os jovens.

A prudência é um freio necessário para que se evitem colisões desnecessárias. A rebeldia equivale ao acelerador.

A prudência é o volante do carro. A rebeldia é o seu motor. A prudência é a autoridade. A rebeldia é o poder.

Converter não é deixar de ser o que é, tornando-se outra coisa. Não se está sugerindo que os rebeldes devem deixar de ser rebeldes pra se tornarem prudentes, nem vice-versa. Conversão é “voltar-se na direção de...”. Se a rebeldia dos jovens for direcionada para a prudência dos justos, a revolução será inevitável.

Tudo o que falamos até aqui foi por inferência.

Porém, temos que voltar para João Batista, em busca do cumprimento do seu ministério.
Como ele trabalhou pela conversão dos pais aos filhos e dos filhos aos pais?

Embora ele não tenha feito qualquer discurso acerca disso, podemos encontrar o cumprimento desta faceta de seu ministério através de seu relacionamento com Jesus.

João era o remanescente de um Era que estava prestes a se encerrar de uma vez por todas. Como dissemos antes, foram 400 anos de silêncio.

O que provoca o abismo entre as gerações é o contexto cultural em que elas vivem/viveram. Os filhos argumentam: Meus pais são de outra época. Eles não me entendem. Já os pais reclamam: Meus filhos não me escutam. Os tempos são outros.

Antigamente, acreditava-se que o prazo de uma geração era de 40 anos. Hoje, verificamos que o espaço de uma década já é suficiente para que haja dificuldade de comunicação entre gerações.

Cada década tem seus modismos, suas gírias, seu vocabulário próprio. As mudanças tendem a se acelerar. Não só as mudanças culturais, mas também as tecnológicas. O que para minha geração era uma novidade, para a geração dos meus filhos é algo comum e corriqueiro.

Se hoje, dez anos já é tempo de sobra pra que haja uma ruptura na forma de pensar e se comunicar entre gerações, imagine o que são 400 anos! É claro que naquela época as mudanças eram mais lentas em comparação às de hoje. Poderíamos dizer que aqueles 400 anos equivaleriam a 100 anos de hoje.

Como era o mundo há 100 anos? Como viviam nossos tataravós? Quanta coisa não mudou de lá pra cá?

De fato, aqueles 400 anos representavam um abismo intransponível. João Batista era uma voz profética que se levantava no mundo, depois de quatro séculos de silêncio absoluto.

Ele era o último expoente de uma espécie em extinção. Até seu modo de vestir era considerado excêntrico para sua época. João vestia-se como um homem das cavernas. Enquanto seus contemporâneos se vestiam de linho, sua roupa era feita de pele de camelo. Enquanto a dieta da população era à base de pão, peixe e cordeiro, ele se alimentava de gafanhoto e mel.

Já Jesus representava o novo, o inédito, o rebelde, a vanguarda.

Jesus e João, embora fossem primos, representavam duas Eras distintas. Cada um tinha seu próprio ritmo e melodia.

Jesus denunciou aquela geração que testemunhou o ministério de ambos:

“Mas, com quem compararei esta geração? É semelhante a meninos que se assentam nas praças e gritam aos seus companheiros: Tocamo-vos flauta, e não dançastes; cantamo-vos lamentações, e não chorastes. Pois veio João, não comendo nem bebendo, e dizem: Tem demônio. Veio o Filho do homem, comendo e bebendo, e dizem: Eis aí um homem comilão e beberrão, amigo de cobradores de impostos e pecadores. Mas a sabedoria é justificada por suas ações” (Mt.11:16-19).

Aquela era uma geração que não se satisfazia com nada. Acho que não era tão diferente da nossa.

Embora João e Jesus fossem tão diferentes em seu estilo, eles jamais tiveram qualquer atrito. É a relação bem sucedida entre eles que deve nos servir de referência para que vivenciemos uma conversão entre a nossa geração, e a geração de nossos filhos e/ou pais.

Jamais houve um choque entre eles. Ainda que tenha havido situações que poderiam ter provocado uma indisposição.

Vamos analisar alguns episódios.

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